terça-feira, 7 de julho de 2015

LÁ FORA, CÁ DENTRO #8: F U Z E T A - Entrevista

Poucos são os grupos que, com pouco mais de um ano de existência, se podem orgulhar de ter pisado palcos como o Festival Printemps de Bourges, o Festival Les Transmusicales, o Festival Francofolies ou, agora em Julho, o FNAC Live, em Paris. É de Vannes, em França, que nos chega um projeto - com uma forte ligação a Portugal - que conseguiu esse feito: os F U Z E T A, Dorian, Charles-Alexandre, Pierre-Antoine e Jérémy, naturais da pequena aldeia de La-Roche-Bernard. De um sucesso local na Bretanha ao reconhecimento nacional depois de terem vencido o Prémio Ricard S.A. Live Music, temos seguido com particular atenção a ascensão destes indie-poppers contemplativos que se inspiraram, entre outras coisas, na luz e na doçura da Fuzeta, pequena foz de terra do Sotavento algarvio. Sonhos e desejos concretizados, esses parecem não ir faltando.





BandCom (BC): Porque é que atribuíram à vossa banda o nome da aldeia onde o pai de três de vocês nasceu? Porque não escolheram La-Roche-Bernard, a aldeia de onde são originários em França? Já agora, para quem não a conhece, como é essa aldeia?

F U Z E T A: F U Z E T A nasceu de um consenso à volta das nossas histórias pessoais: queríamos transmitir algo que fosse bonito, verdadeiro, solar. Queríamos falar de coisas verosímeis, que vivemos e não projetar-nos através de uma postura ou de personagens fantasmagóricos. Encontrámos a solução nas nossas infâncias respetivas, nesses momentos doces e menos doces que vos forjam, que vos fazem avançar na vida, de que por vezes sentem falta uma vez adultos. Encontramos isso tudo na nossa música: os risos, as lágrimas, a nostalgia das alegrias estivais da nossa infância onde o sol inunda as imagens dos nossos banhos no rio. No que diz respeito a La-Roche-Bernard, teria colado perfeitamente com esse espírito mas a eficácia levou-nos a buscar algo bem mais curto. Fuzeta não é a aldeia onde o nosso pai nasceu (essa confusão nasce do facto de nós termos descoberto esse sítio graças a ele), mas conhecemos a Fuzeta por lá termos estado várias vezes durante a nossa adolescência. Pensámos em F U Z E T A porque evoca o sol, a natureza, algum exotismo e também um lado pitoresco, da "pequena aldeia perdida", que também podemos encontrar em La-Roche-Bernard.



BC: Qual é a vossa relação com Portugal ? Conhecem bandas/artistas portugueses?

F U Z E T A: Conhecemos Portugal desde o início da nossa adolescência. Íamos surfar na Arrifana todos os anos, no Algarve, onde um amigo tinha uma pequena casa na praia. É um país maravilhoso onde a natureza e as paisagens são grandiosas. Desde há uns anos para cá, o nosso pai instalou-se em Almada, na margem sul do Tejo. Vamos lá de vez em quando passar uns dias para desfrutar da doçura lisboeta e das inúmeras riquezas da capital. No que diz respeito à cena portuguesa, não estamos muito a par. Conhecemos alguns grupos graças a Frank Darcel que durante uns tempos viveu e trabalhou em Portugal. É da Bretanha e beneficia de uma imensa "aura" na nossa zona porque é um dos fundadores com, entre outros, Marquis de Sade, da cena de Rennes do início dos anos 80.


BC: São um grupo relativamente jovem, o vosso primeiro espectáculo ao vivo ocorreu em Novembro de 2014…e desde então, são muitos os media franceses que apostam em vocês. Como explicam essa recepção e o sucesso que alcançaram localmente em tão pouco tempo? É o fruto de um trabalho árduo nos bastidores?

F U Z E T A: O nosso primeiro concerto foi no dia 8 de Novembro de 2014 no festival "Les IndisciplinéEs" mas não foi a primeira vez que tocámos o nosso set. Uma estrutura de Lorient (MAPL) acompanha-nos desde Dezembro de 2013. Esse apoio traduziu-se em períodos de trabalho em palco, no Manège, onde pudemos trabalhar e ensaiar os nossos temas. Também permitiu-nos beneficiar de intervenientes qualificados no que diz respeito ao canto, à gestão do palco mas também de conselhos permanentes sobre a promoção, os obstáculos a evitar e todas as coisas importantes que os jovens grupos nem sempre conhecem. Trabalhámos sempre com pessoas que nos permitiram preparar-nos da melhor das formas antes de sair da sombra e que sobretudo, ainda hoje nos permitem apreender da melhor das formas o Mundo no qual avançamos. No que diz respeito ao feedback positivo do público e dos media, estamos felizes que a nossa música consiga tocar as pessoas. Dá-nos ainda mais força para que o que aí vem seja à altura das suas esperanças.


BC: Uma das vossas primeiras grandes conquistas foi a vossa presença no famoso festival Les Transmusicales em Rennes. Como correu?

F U Z E T A: Foi vertiginoso. Um dos maiores festivais de novos talentos do Mundo e nós, com os nossos cavacos e os nossos 7 primeiros concertos a tentar "acender a fogueira"! Foi bastante intenso, o concerto correu bem, havia gente, as pessoas estavam contentes e nós ainda mais. Estamos muito gratos à organização do festival que nos acolheu maravilhosamente no palco do L’Etage e o resto do fim-de-semana. É muito importante para os grupos, sobretudo quando são jovens e ficam um pouco impressionados com o gabarito da coisa. Foram todos amigáveis, atenciosos e prestáveis connosco, à imagem do nosso encontro com Jean-Louis Brossard, caloroso e entusiasta acerca da nossa participação no festival. Um imenso obrigado a eles todos.





BC : Como se sentiram depois da vitória no Ricard S.A. Live Music?

F U Z E T A: Estamos muito contentes! Todo o dispositivo que nos acompanhou e os meios que a equipa do Ricard S.A. Live Music pôs ao nosso dispor ao escolher-nos foi enorme. Acelerou muito as coisas. Esperamos sobretudo desfrutar dessa exposição para encontrar um editora, um booker que se ocupe de nós no futuro. Estamos nas nuvens. Que grupo nunca teve o sonho de tocar em todas estas salas, com bastante público, quando ainda só está a dar os primeiros passos?


BC : Como é que se prepara um concerto quando editaram apenas 3 músicas? Optaram pelas 'covers' ou ofereceram aos vossos primeiros fãs músicas inéditas - algumas delas incluídas na segunda parte do EP que saiu em Maio - ou que se calhar nunca vão ser editadas? Se assim for, os vossos primeiros fãs foram uns privilegiados…

F U Z E T A: Ao vivo tocamos 11 músicas. São todas criações nossas que permitem a quem nos vem ver descobrir muitos temas que ninguém encontra na Internet: há, obviamente, as outras músicas do EP que saiu em Maio mas também temas que nem sequer gravámos. Estamos a trabalhar atualmente para apresentar um set rico para as próximas datas. Adoramos oferecer ao público algo único, sem falar em privilégios, mas queremos que a experiência vivida pelas pessoas nos nossos concertos seja marcante e o mais emocional possível. Por exemplo, tivemos a sorte, no festival Les Transmusicales, de participar com uma escola de música do Pays de Rennes e um projeto com alunos que vinham adicionar percussões, ventos ou canto. O resultado foi uma representação única num pequeno teatro. Foi intenso! As crianças pareciam mesmo felizes e nós estávamos felizes por termos criado algo novo e diferente com a nossa música. O público presente sentiu esse lado “mágico” daquele instante e ficaram todos com ótimas recordações.


BC: Parecem estar muito ligados, com um espírito que diria quase familiar, com muitas memórias e histórias em comum… Pensam que o vosso grupo podia contar uma história próxima da que nos propõem se não tivessem vivido todas estas coisas juntas quando eram pequenos?


F U Z E T A: F U Z E T A chegou numa altura em que estávamos preparados para fazer uma música autêntica e interessante todos juntos. A história que contamos é parecida connosco mas a dimensão dos temas que trazemos connosco - a infância, a fraternidade, a nostalgia... - é universal. São coisas que existem em toda a gente e pensamos que cada um pode encontrar na nossa música uma ideia, uma emoção que o pode tocar.


BC: Quando lemos as vossas entrevistas, sentimos em vocês uma certa proximidade com  a natureza, como se quisessem fazer um paralelo entre ela e a vossa infância, à volta de temáticas como a proteção, a inocência, as relações com os seres vivos. Tudo isto é pensado ou nem por isso ?

F U Z E T A: Crescemos na Bretanha. É um sítio esplêndido. As luzes variáveis, as paisagens dignas de postal, o oceano em movimento perpétuo, a natureza sempre próxima, bonita e intrigante… tudo isso influenciou-nos e, mais ou menos conscientemente, construiu-nos. Os dias onde o sol desvanece e deixa de repente uma sombra que escurece e estoura, aquelas tempestades invernais potentes que nada pode parar, aquela pequena brisa de Verão que leva o sal do mar até às aldeias mais próximas… todos estes contrastes, essas cores, consegues encontrá-las em F U Z E T A. Por exemplo, a intro íntima de "Ferns", seguida por aquela subida que te leva até ao fim, onde as ondas das guitarras despenham-se por cima dos toms da bateria. Mesmo se isto acabar por ser um pouco cliché, podemos dizer que não falamos da Natureza nas nossas canções mas que é a Natureza que fala através nós.





BC: O que se sente por momentos no videoclip realizado por Mathieu Ezan...
Podem dizer-nos mais coisas sobre ele e sobre o seu passado no Mundo da música? Porque é que o escolheram?


F U Z E T A: No que diz respeito ao videoclip há uma história interessante: foi realizado no jardim da nossa infância. O rochedo do fim é o mesmo de onde saltávamos para o rio quando éramos putos. Isso resume bem a ideia de que, mesmo sem sabê-lo, uma sensação de autenticidade desprende-se dessas imagens em coerência com a música. Mathieu é um amigo de infância do Jérémy. Conseguiu, ano após ano, impor-se como uma referência no meio das músicas mais extremas, em termos de fotografia (live e imprensa) e mais recentemente na realização de videoclips. Pensámos nele porque é muito bom e sobretudo sensível àquilo que fazemos, à nossa música. Falámos longamente do universo que queríamos pôr em relevo e rodámos no final do Verão passado. Ainda não tínhamos a gravação de “Dive” mas queríamos que a luz do Verão estivesse presente: esse lugar e essa luz evocam o que é F U Z E T A para nós.


BC: Quais são as vossas influências musicais, cinematográficas? Que tipo de música acham que fazem e porquê?

F U Z E T A: O "conteúdo" é para nós a base de tudo: pouco importa a forma se a história está presente, é autêntica e inteligível.
Ouvimos muita música que em geral não tem grande coisa a ver com a estética dos F U Z E T A. Este grupo nasceu porque queríamos contar uma história, a "forma" que foi tendo aos poucos impôs-se sem termos pensado muito nela. Com alguma distância, diríamos que fazemos pop ou indie-pop. Os grupos aos quais nos comparam são oriundos da cena indie-pop americana como The Shins ou Grizzly Bear - agradecemos o elogio mas, para sermos honestos, não ouvimos muito esses grupos. Para o lado cinematográfico, tentamos que a nossa música seja expressiva, o mais humana possível, com laivos de grandes espaços e de ternura: temos de imaginar uma mescla entre "Era Uma Vez no Oeste" de Sergio Leone e "Her" de Spike Jonze.



BC: Onde foi gravado o EP ? Quais são as vossas ambições?

F U Z E T A: Este EP, composto por 6 temas, foi gravado no estúdio La Senelle, em Laval, com Amaury Sauvé. Sabíamos que ele tinha uma maneira de abordar as coisas muito particular e, sobretudo, de captar o som da bateria como pouca gente sabe fazê-lo. Foi um momento verdadeiramente intenso.. conseguiu captar esses momentos raros que fazem de um grupo mais do que a simples adição dos seus membros. Depois, fomos ter com Sébastien Lhoro (AGM Factory – Near Deaf Experience) para o mastering e aí encontrámos uma pessoa única, qualificada e sensível ao nosso universo. Entre a riqueza humana dessa aventura e o resultado final dos masterings, estávamos impacientes de poder ter nas nossas mãos o objeto final. Depois do lançamento, gostávamos de fazer muitas coisas: compor novos temas, encontrar uma editora para concretizar o nosso primeiro álbum...e claro, continuar a nossa tournée, agora via as Ricard S.A Live Sessions.


Mickaël C. de Oliveira




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