sábado, 6 de dezembro de 2014

GALA DROP - "II" (2014, Golf Channel Recordings)



Depois de um surpreendente e disruptivo EP com Ben Chasny dos Six Organs of Admittance, os Gala Drop, um super-hub de mentes criativas que já incluiu, por exemplo, Tiago Miranda, ajustam novamente a sua formação - sai Guilherme Gonçalves para se dedicar mais ao trabalho como Coclea e entram Jerry The Cat (veterano de Detroit agora também dos Loosers e a emprestar aqui de forma decisiva a sua voz e os dotes de tocador de conga) e Maria Reis, das Pega Monstro - para "II", o novo trabalho que acabam de lançar, de novo, pela nova-iorquina Golf Channel.




Não está por muitos segundos a entrada de rompante da luminosidade de "II" que parece que começa no exacto momento de escolher o que ouvir para conciliar pedaços e formas de vida com estados de espírito em pequenos minutos.
Mas não percamos o critério. A ligação umbilical entre o esplendor místico de África sem limites e a originalidade da perfeita combinação da balearica e dub, o lado hipnotizante e quase psicadélico do kraut motiv e as raízes da música de dança espremidas até à raiz do funk e disco...tudo isto continua aqui, mas nunca antes o lado mais free-rock dos Gala Drop esteve tão em evidência.
Ou talvez, não seja caso de termos de saber para que lado nos teremos de voltar e escolher, qualificar o que é que não é demasiado altissonante nem demasiado técnico num autêntico pagode. Começando pelo síndrome de Estocolmo da austeridade da oriental "You And I" com que os pespontos electrónicos encaminham um dub surpreendente pelos ecos de uma voz inesperada, encontramos logo de seguida o primeiro tema conhecido do disco, "Sun Gun", interligado na perfeição com a anterior "Big Things" para o topo cosmico-exótico do CD, tortuosamente mais perto de uma canção tradicional e, por isso, também mais perto do que mais parece difícil experimentar: a fuga ao desmembramento cuidadoso para colagem imediata aqui e acolá.
É na digressão pelas potencialidades, talvez ainda nem materializadas por completo, do universo sónico dos Gala Drop e pela forma como o colectivo é apaixonado pela música que sabe/quer fazer e exigente ao ponto de querer apenas beijar de forma inventiva o expectável - por um título, por uma linha de baixo, por um flash de sintetizador - que mais à frente "Monad", "All Things" e "Slow House" e "Let It Go" são tidas e achadas como gemas preciosas de uma reinterpretação e assimilação sem necessidade de retoque, o mesmo que nunca o samba vira sem maconha digital para o culminar de uma cascata excêntrica de sensações.





"II" é, em última análise, a jornada solitária de um veterano de uma cena musical tão diversificada, à procura do sol e que acaba por encontrar-se a si mesmo numa banda onde polirritmos, beats orgânicos e arpeggios clássicos são remediados de fresco.
Para os Gala Drop, onde conseguem ser mais expansivos e concretizar ideias, sobretudo ao nível do formato canção, que fariam de qualquer treinador de bancada gente feliz com lágrimas no rosto e com a cabeça às voltas porque a cereja não está nunca exactamente no topo do bolo.
E este "II" é, com os pés bem assentes na Lisboa fervilhante e já não serendipitosa de 2014, um álbum de outro Mundo.


André Gomes de Abreu




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