“Olá, o meu nome é Darko...”. Pode parecer
insignificante, mas é um dos pontos mais importantes para a percepção do
trabalho que estou a desenvolver. Chamo-me João na “vida real”, Woner no que
toca a trabalhos musicais, e digo que me chamo Darko (algo que, segundos
depois, é corrigido por uma voz que se deduz ser o meu psiquiatra).
É uma faixa composta por três partes. A primeira
começa com um diálogo que dá a conhecer que a personagem está numa consulta
(num grupo de várias pessoas) porque se tentou suicidar. Começo a cantar na
segunda parte com uns acordes de piano repetitivos e desinteressantes (é também
assim que a personagem se sente) e na terceira parte, nos últimos minutos, o
instrumental muda e fica mais “animado”. Tirando a parte inicial do diálogo, é
uma música muito pessoal. Creio que foi a primeira faixa pública em que falei
abertamente sobre autoflagelação, odio próprio, isolamento e amigos imaginários.
Inicialmente a música ia-se chamar “APSE” (As
Pessoas São Estúpidas), mas faz mais sentido “AMCSSC”.
2. Prozac 2
Esta faixa é um remake (talvez não seja o
termo correcto) de uma que integra o primeiro volume que fiz nos princípios de
2011. Lembro-me que fui atuar com o meu grupo, Diatribe, e depois fui a casa do
Suary. Ele estava a mostrar-me instrumentais e a improvisar. Gostei muito de um
deles, cantei a letra da “Prozac” porque não gosto de improvisar (de forma
séria) e ficou. A letra surgiu com o terminar de uma relação. Quem amava deixou
de estar presente e os comprimidos preencheram o vazio, nesta altura ainda não
era de forma destrutiva, faziam-me sentir bem e estavam presentes todos os
dias.
3. Cão
Também em 2011, andava a queixar-me de falta
de beats. O Neatro deu-me este no mesmo dia em que fiquei com o da “Prozac 2”.
Embora a “onda” principal do meu trabalho seja
depressiva, gosto sempre de ter uma ou duas músicas “estúpidas” com elementos
de autocrítica algo engraçados (técnicas para quebrar o gelo). Esta é uma
dessas faixas.
Quem me conhece sabe que eu e os cães não nos
damos bem. Eu acho que são animais bonitos, mas eles não gostam de mim e na
maior parte das ocasiões os donos são completamente irracionais. O tema surgiu
do seguinte pensamento: o cão pode ladrar em qualquer lado, ir com as patas
contra qualquer pessoa ainda que sujas por tocarem no chão, morder quem
entender como ameaça, praticar o acto sexual onde bem entender, e aos olhos das
pessoas continua a ser bonito e querido. Então e se eu fizer tudo isto? Será
que não vou levar logo dois socos na cara? Não me vão insultar? Não vou estar a
interferir com a liberdade de cada um? Vou, e é exactamente por isso que vai
ser engraçado.
Esta música não é uma crítica aos cães (que
honestamente não têm culpa de nada) nem aos donos (que dizem sempre: “Ele não
morde, ele não morde...”, até morder). É uma autocrítica, porque eu é que sou
um universo de imperfeições. Se estão todos bem menos eu é porque o problema
reside em mim (é assim que se deprime numa música aparentemente engraçada).
4. Cheeseburger (c/ Neatro)
Esta foi gravada tão em cima da hora que
acabei a mistura a dias de sair o álbum. A ideia surgiu quando estávamos na
paragem do autocarro. O Neatro estava a comentar um vídeo que tinha visto sobre
a forma como fastfood se degradava. Eu disse que não queria saber, pois o que
me apetecia mesmo naquele momento era um cheeseburger e não me importava se
morresse mais cedo. Ele disse que preferia comer algo saudável para poder viver
mais tempo que as outras pessoas. Foi assim. Durante a música toda estamos a
contrariar as ideias um do outro.
Na história do álbum esta faixa mostra um
pouco mais sobre os pensamentos depressivos do personagem e mostra como os
amigos reagem face à nuvem de negatividade que paira nele.
(aos 48 segundos começa um dos meus momentos
preferidos)
5. Eu Não Nervos
O título indica uma situação em que quero
dizer “não tenho nervos” ou “não estou nervoso” e me engano e troco tudo. O
erro torna evidente que estou nervoso quando queria dizer que não o estava para
passar despercebido (sou tipo aquelas pessoas que tentam passar despercebidas e
acabam por estragar as coisas e chamar a atenção sem querer).
A música começa com um som de theremin e um
excerto de um dos filmes em que me baseei para criar a narrativa. O que quero
que se retenha é que a personagem tem pensamentos obsessivos que a consomem, e
vê tudo o que a rodeia como uma ameaça. Tudo a irrita e isso começa a torná-la
agressiva. Neste ponto da história não estamos a falar simplesmente de uma
depressão.
O instrumental é dos mais recentes que fiz
neste álbum e é dos que gosto mais.
6. O Bebé Levou Um Tiro
Graças a esta música recebi dois emails de
pessoas que levaram a mal o tema. Existiram mais 2 versões desta música. Uma
que fiz em 2011 que não era nada agressiva e falava sobre a minha infância em
Lisboa, e outra que seguia a linha de pensamentos “agressivos” da original com
um instrumental todo tocado meio psicadélico. Optei pela versão que está no
álbum por estar mais crua.
Esta música desenvolve a linha da faixa
anterior e aborda os chamados pensamentos intrusivos. É uma conversa com o
psiquiatra em que o personagem admite ter pensamentos agressivos para com
outras pessoas, sonhos em que mata sem motivo aparente pessoas que estão
felizes num jardim (mais um elemento de outro filme). Aborda mais uma vez,
depois do refrão, a insegurança face às pessoas que encontra no seu caminho, e
o facto de se meterem com ele só agrava o seu estado psicológico. Quando parece
acabar a música ouve-se uma linha de baixo com uns snares algo descoordenados
enquanto “grito: “Eu não sei o que digo!”, várias vezes. Isto serve para dar a
entender que o personagem sofre por pensar em fazer mal às pessoas, ou seja,
não é algo que controla. Depois disso entra um instrumental diferente todo
tocado que, sinceramente, por muito piroso que esteja, é dos que mais gosto. No
final paira a ideia: “... Eu não te quero fazer mal... A culpa não é minha... Foge...
Tu tens de fugir de mim... Morre...”.
7. Lápis de Niizuma
Nos últimos segundos da faixa anterior ouve-se
a voz do psiquiatra a dizer para a personagem tentar relaxar e fazer algo que
goste, como desenhar. Durante a música vê-se que a personagem tem uma
imaginação muito fértil enquanto desenha histórias nas paredes do quarto, e que
tem um desejo muito forte em ser o herói que salva o mundo (talvez para que as
pessoas que não gostam dele o aceitem). A meio, percebe que se deixou levar
pela história que estava a desenhar e que perdeu a noção da realidade
momentaneamente. Debate-se ainda com o ódio que sente pelas pessoas que salva e
pondera se deve ser o herói ou o vilão.
A última parte da faixa tem referências
“escondidas” ao Super Sonic, Crash Bandicoot, Final Fantasy e Kingdom Hearts,
isto porque a música revela, no fundo, a solidão e a falta de vontade de viver
esta vida, e nesses momentos as memórias de infância e adolescência são
reconfortantes.
(esta música vai ser muito importante)
8. Casa de Gelo
Instrumental que mais me agrada neste álbum.
Vou tentar explicar por partes. A música
serve para dizer que a personagem revela ideação paranoide e tem ataques de
pânico. Digo “...o gelo é uma metáfora para o medo que sinto”, logo quando dou
a entender que não há saída do quarto porque está coberto por gelo estou a
dizer que tenho medo de sair. Quando digo que faço um boneco de neve para ser o
meu melhor amigo estou a dizer que convivo tanto com o medo que me habituo à
presença dele. Perto do fim, antes do instrumental mudar digo “hipotermia”,
estou a falar de um ataque de pânico. Tive a ideia de fazer esta metáfora do
gelo/medo e de fazer um boneco de neve amigo que se vira contra mim em 2011.
Na altura era num instrumental do Neatro. Claro que, mesmo tendo a ideia na
cabeça não escrevi, deixo sempre as coisas a cozinhar até chegar o momento.
Já em 2013, estava eu a stressar a tentar
fazer o álbum e não reprovar a nenhuma cadeira, e vi que era muito complicado
para o Neatro refazer o instrumental (também por falta de tempo fora de aulas).
Um dia sentei-me com o teclado, lembro-me que andava a ouvir uns álbuns de
música electrónica/experimental e tentei fazer algo inspirado nisso. Algo com
ambiência, com rara aparição de snares cheios de reverb, um piano no fundo
também ele com reverb, um coro (muito piroso, mas que adorei), e aquele
sintetizador que entra aos 2:23... Eu gostei. Não é o que o pessoal do rap
procura e gosta, mas era aquilo que eu queria explorar. O instrumental muda
completamente aos 3:24, é algo que gosto muito de fazer (o vol.3 está cheio
dessas coisas).
9. Insónias Diurnas (c/ Suary)
Claro que tinha que ficar com este beat do
Suary.
De noite a insónia não deixa dormir, e de dia
o “sono” (ou desinteresse) não nos deixa vivenciar as coisas à nossa volta.
Portanto, estar acordado de dia é igual a estar a dormir (como diz o Suary), e
de noite a paranóia decide bater à porta.
No final da música, à semelhança da faixa com
o Neatro, a personagem é de novo abandonada pelos amigos que já não conseguem
suportar o “drama”.
Em Julho ou Agosto já tinha a faixa gravada,
pronta para masterizar e lembrei-me de um instrumental que o Suary tinha feito
num dia em que estivemos a produzir e pensei que ia ajudar a consolidar a
música geral. Quando acabamos de cantar entra esse instrumental (quase no fim), acho
que resultou muito bem.
10. O Reflexo de Nada/ O Convite
Foi a primeira faixa que produzi e escrevi
neste álbum. Nesta altura ainda recorria a samples para fazer instrumentais.
Estava a ver um filme com a minha irmã, que tem um final algo emocionante para
quem é da minha geração. No meio da emoção ouço o sample... Fui logo procurar.
Encontrei, fiz o beat, escrevi, gravei, ficou feito. No que diz respeito à
história do álbum esta faixa é um reafirmar da depressão, dos cortes, do
isolamento, ódio próprio, etc.
É também a faixa em que a personagem se
mentaliza que vai morrer.
Quase dois anos mais tarde decidi juntar um
instrumental, no fim, de nome “O Convite” porque achei que a faixa original
estava incompleta, faltava algo. Não é que este tenha uma produção
incrivelmente boa, não era esse o objectivo. Serviu para completar. É um
instrumental inquieto, incerto, a bateria não está bem no tempo, apetece pôr
“direito”... É bom porque as pessoas deprimidas também não se sentem
“direitas”.
11. Demasiado Tempo
Uma vez que a personagem decidiu morrer, não
tem mais que ter medo ou vergonha de dizer o que sente. A música anda em torno
disto. O objectivo é convencer o psiquiatra de que não dá para adiar mais os
comprimidos e que têm que ser receitados sem demora. O final da música tem um
excerto de mais um filme em que me inspirei. “Until the day you die, you, not
me, will always be shit!” é a mensagem final que a personagem deixa às pessoas
que a magoaram antes de se fechar e acabar com tudo.
12. Frágil Porcelana
Estive quase para não fazer esta música (ainda
bem que a fiz porque foi a que as pessoas mais gostaram). Já tinha todas as
faixas ordenadas e escritas num papel. Se não me engano, isto foi em 2013. Já
não usava samples para fazer instrumentais e houve um dia em que me apeteceu
voltar a fazê-lo. Ainda ponderei se devia escrever ou não. Enfim, correu bem.
Na história do álbum esta faixa representa as últimas horas antes do
suicídio. O personagem passa o tempo que lhe resta a beber no chão do seu
quarto com a mobília toda destruída. Embebeda-se porque no fundo quer ficar. Só
não fica porque não se sente aceite, na sua cabeça a culpa é das pessoas
(factor muito importante para o vol.3). Desesperado diz: “eu também me
odeio”... Podemo-nos dar todos bem porque também me odeio, finalmente temos
algo em comum.
No final há um pequeno interlúdio em que
repito algumas vez: “Eu sou o palhaço triste”. Uma referência a uma música do
primeiro volume e também um aviso aos artistas de rap que começam agora a pisar
a sonoridade “alternativa” e a temática depressiva. Eu sou “O” palhaço triste.
13. 05 x gm06 cazorp
Esta faixa serve para o ouvinte descansar um
bocado. Do ponto de vista da narrativa, se atentarmos ao nome está escrito :
prozac 60mg x 50. Este é o momento em que o personagem toma 50 comprimidos de
60mg de prozac, ou seja...overdose.
14. 005
Bêbedo, momentos antes de o excesso de
comprimidos surtir efeito negativo, aprecio o ambiente que me envolve. É uma
última reflexão antes de cair do 5º andar. Se é para recorrer ao suicídio é
para partir em grande, ou seja, bêbado, com 50 comprimidos de prozac de 60mg, e
uma viagem do topo do prédio até ao chão. Tudo isto de gravata, claro.
O instrumental foi feito pelo Raikuaza.
Inicialmente era outro beat, mas ele perdeu-o. Foi passando o tempo, e um mês
antes de sair o álbum decidiu dar-me este, que foi um beat pelo qual eu tinha
uma fixação desde que o ouvira pela primeira vez.
15. O Grito do Silêncio, a Lua e o Beijo
Esta diz-me muito. Não pelo tema, limitei-me a
seguir a narrativa com base no que sinto. O beat marcou uma fase da minha vida
em que fiz imenso trabalho musical e muito pouco para a faculdade. Não sei
dizer porque me marcou, mas sempre que ouço o instrumental lembro-me desses
tempos em que ia para as aulas fazer instrumentais e trabalhar no álbum, nem
nos intervalos parava. Às vezes, acordava cedo, chegava lá, faltava e ficava
algures numa sala a ”produzir”.
Voltando à narrativa. Isto é quase como se a
personagem se estivesse a ver a ela própria estendida no chão. Como se o tempo
tivesse parado e o sangue ainda não estivesse a cobrir o cimento. É a
experienciar a morte. É um adeus.
16. 28 06 42 12
Fiz este instrumental a meio de uma aula do
meu segundo ou terceiro ano de faculdade. É uma faixa sem voz, algo melancólica,
que encaixa no álbum sendo que, segundo a história, morri na música anterior. É
o final do álbum. Contudo, nos últimos segundos ouve-se uma voz distorcida a
dizer: “Acorda”. Algo para dizer que vai haver um terceiro volume (ou não seria
uma trilogia), ou que talvez não tenha morrido, é novamente uma menção a um
filme. A voz pertence a uma das personagens principais do vol.3 (que foi
mencionada durante o álbum).
É desta forma que acaba o “A Minha Cabeça Sai
Sempre Cortada (Vol.2)”.
1 comentários:
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