domingo, 9 de fevereiro de 2014

SENSIBLE SOCCERS - 8 (2014, PAD/GROOVEMENT)

Título: 8
Edição: PAD/Groovement
Classificação: 8.8/10

Corria o ano de 2011 e no EP homónimo de Sensible Soccers, “Fernanda” destacava-se em todo o trabalho que até à altura tinha sido editado pelo quarteto natural de Fornelo, Vila do Conde. Predominava o eletrónico ambiental com a componente da guitarra que acrescentava à música uma emaranhada e complexa rede sonora, onde se descobria algo até então nunca feito em Portugal.

“Fernanda” ganha novo destaque quando, no presente e após três anos, a banda edita o primeiro trabalho em formato longa duração, “8”, composto pelo mesmo número de temas e que têm sido trabalhados ao longo dos dois últimos anos, numa colaboração entre as editoras PAD e Groovement

De facto, e logo à primeira audição, o LP demonstra aquilo que a música anteriormente referida é capaz de resumir. Se a componente eletrónica é fortemente vincada e intrínseca aos Sensible Soccers, por outro lado há linhas de guitarra que lembram influências de outros géneros e marcam o compasso, permitindo executar algumas quebras saudáveis. Tudo isto, repare-se, sem imitar a antecessora “Fernanda”, constituindo esta a base sólida que permitiu um amadurecimento notório e objetividade no som relativamente a trabalhos anteriores.



É “Nikopol” que abre o disco, funcionando deste modo os sintetizadores como instalação de um ambiente quase divino, intergaláctico. Este aspeto revela o início de uma das fortes características deste LP, isto é, a forma de abordar os temas sempre por partes e quase como se de uma tática se tratasse, começando pelas linhas base e evoluindo progressivamente até à sua própria consagração.

Nos moldes anteriormente descritos, “Manuel” evolui através de uma sequência de loops que relembra o mesmo tipo de progressão de “Wild Piano”. Não sendo uma faixa completamente estática, é-o na sua estrutura principal, permitindo alguns devaneios sonoros através de distorções profundas de guitarras que vão prometendo explodir, não chegando efetivamente a fazê-lo e deixando espaço para “AFG” aparecer. Assim, com um verdadeiro toque em crescendo ditado pelas sequências acrescentadas a cada novo compasso, é já aos quatro minutos que nos apercebemos nesta que algo vai realmente tornar-se numa verdadeira selva de ruído.

 

É esse o mote em crescendo que permite surgir “Sob Evariste Dibo”, com a componente pop mais ao descoberto a fundir-se à eletrónica, ao jeito de deixar o corpo hipnotizado (no qual o baixo tem igualmente um papel relevante). A guitarra vai desenhando inicialmente em riffs crus e soltos os contornos da dinâmica da música, que ao evoluir se carregam de delay para preparar a quebra final onde o sample que quase desde o início acompanha o som, ganha destaque principal para novamente se deixar enovelar pelo instrumento. Note-se que este é provavelmente o tema que melhor revela as bases sonoras já características deste quarteto de artistas, além de que transmite toda a complexidade inerente à marca que os próprios vão construindo sem medo, sendo cada vez mais eles próprios a poderem influenciar do que a serem influenciados.

Se até aqui já se referiu o que se podia esperar da banda, isto é, um pop-rock psicadélico com forte componente elétrica movida pelos sintetizadores, é talvez pela maior duração de “8” que “Paulo Firmino” e “Maria Rosa” são as primeiras faixas a surgir no seu reportório como uma quebra completa ao que já tinha acontecido tanto neste disco como em trabalhos anteriores. Com uma melodia simples na guitarra, durante a primeira parece existir uma tentativa de limpeza cerebral face ao complexo processo sonoro que se tinha desenvolvido até ao momento, abrindo igualmente espaço a uma introdução a “Ulrike”. Esta responde, e mesmo com o seu toque espacial, vai crescendo não em intensidade mas antes através da coleção de vários sons que se vão experimentando e misturando aqui e ali.



É finalmente a segunda quem traz, na sua forma ritmada, o doce prenúncio de um fim que podia ser mesmo esse, não fosse “Lima” consagrar “8” com uma estranha abstração da teia sonora a que vimos sendo habituados. Continuam a surgir guitarras embrenhadas em distorções acompanhadas do seu experimentalismo, mas ainda assim muito mais suaves, deixando-nos envolvidos no universo elegantemente simples e frio de Boards Of Canada aliado a essa característica de Sensible Soccers. É desta forma que resolveram assim colocar o ponto final, ao retomar a sonoridade ambiental com que abriram o mesmo disco, embora não do mesmo modo, mas antes a jeito de celebração nostálgica.

Não restam dúvidas que este será um marco importante para a música em Portugal. Não que “8” traga efetivamente muitas novidades (algumas músicas como “Manuel” ou “Sob Evariste Dibo” já tinham sido escutadas em várias performances live), ou que seja já um dos discos de 2014 (já que este ano se anteveem lançamentos de projetos de peso no país). Além disso, previa-se algo mais que quarenta minutos a saber a pouco. Mas a verdade é que estes quatros rapazes também só precisaram de um single em 2013 para saldarem esse ano de forma positiva, e agora acabam por se instalar confortavelmente nos nomes que vão soando tanto pela novidade como pela criatividade. Através disso, e porque o seu som realmente permite, poderão garantir a projeção que muito poucos projetos portugueses são capazes de ter durante uma carreira inteira, e que se chama internacionalização.


João Gil




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