Cabeças de cartaz na dia 2 de agosto, os Orelha Negra tiveram a difícil tarefa de representar o hip-hop (inter)nacional no FUSING Culture Experience. O BandCom esteve à conversa com Sam The Kid, João Gomes, Fred Pinto Ferreira e DJ Cruzfader instantes antes daquele que foi um dos grandes momentos da primeira edição deste festival. Sampling, cinema, arte urbana, hip-hop, falou-se um pouco de tudo.
BandCom: Vocês partem quase sempre da base de um sample para criar a vossa música. Isso não acaba por limitar, de uma certa forma, os vossos horizontes?
Sam The Kid: Não, pelo contrário. Para já, não é obrigatório a música começar do sample. Por exemplo, músicas como "A Cura" ou "Since U Been Gone" começam de um baixo, de uma bateria, de um teclado… e depois aparece o sample como uma ferramenta.
João Gomes: Não é bem uma ferramenta. Acho que se tiveres uma linha, um caminho, se
calhar segues esse caminho e fazes uma viagem por aí. Ajuda-nos a ter alguma ideia.
Sam The Kid: Por exemplo, quando estou rodeado por músicos, eu normalmente, se eu trabalhar só com samples, já não posso andar na rua e começar "pumpumpumpum pumpum". e depois tentar ouvir o disco a ficar à espera que a música esteja lá. Mas à mesma, não me vou limitar a ter uma ideia melódica e depois pedir a alguém para tocar. Por isso, é igual a qualquer banda.
BandCom: Acabam por propor sempre também mixtapes...
Sam The Kid: Normalmente, é muito raro serem editados álbuns instrumentais que depois passam a ser vocais. Por exemplo, a música "Since U Been Gone" com Orlando Santos chama-se no nosso álbum "A Memória". Isso prova que a música dá uma excelente canção.
João Gomes: Era um tema que no álbum era um pouco abstrato, sem grande forma. E depois do Orlando ter cantado, exatamente em cima daquele instrumental, com uma certa lógica, tornou aquilo numa canção.
BandCom: Não foi só para chegar a outro público...
Fred Pinto Ferreira: Não...É por nós curtirmos e para ver também aquilo que os cantores fazem com as nossas músicas. Não lhes damos nenhuma regra. O objetivo é eles fazerem aquilo que querem, e também vermos a volta que eles dão à música, a leitura que eles têm dela.
Sam The Kid: Se nós tivéssemos essa manha, nós estaríamos neste momento a fazer discos. Ou seja, dar concertos com vocalistas, etc. Mas não estamos a fazer isso, e só vamos fazer agora no Sudoeste, pela primeira vez, porque vai ser um concerto especial.
BandCom: Vai haver medleys no concerto? É por ser um desafio que apostam tanto neles?
Sam The Kid: É um desafio, acima de tudo é um exercício. É para as pessoas terem exemplos mais abrangentes, mesmo que nem sempre… Às vezes, por exemplo, se curtires hip-hop, também te podes sentir especial: "hey este gajo tá a tocar isto, estas pessoas não sabem aquilo que estão a fazer!" Tem um sentido quase pedagógico também, se por exemplo não conheceres o Big James. E depois também pode ser usado como um trunfo. Se estamos num ambiente assim mais festivo, pomos mais medleys dentro desse género…
BandCom: É preciso também muito tempo, muita cumplicidade entre os membros. Conseguem gerir isso tudo com os vossos outros projetos?
Todos: Sim, sim.
Cruzfader: As vezes, até tenho trabalho de casa (risos).
Fred Ferreira: É uma cena complicada a montar. Demoram-se alguns dias a montar isto. Há um medley por exemplo que encaixa 6 ou 7 músicas. Agora já os tocamos com mais facilidade, também já estamos mais habituados. Para teres uma ideia, nós existimos há quatro anos, e só temos 6 medleys ou 7. Não conseguimos fazer assim tantos como isso mas também não queremos só tocar medleys.
Sam The Kid: Mas a regra é que seja baseado em samples. Por exemplo, tocámos uma música da Nneka não baseada em sample, mas depois posso ir buscar um sample do Kanye West, e isso é a parte criativa da cena.
João Gomes: Muitas vezes os samples podem ser verdadeiramente excertos de gravações que já aconteceram. Nós queremos ter ideias, criar a partir de melodias daqui e dali. E temos um pouco essas duas coisas, que são: estarmos a tocar coisas que não existem mas inspiradas em coisas que já existem, ou estarmos a pegar num sample no qual o Sam já pegou.
Sam The Kid: Nós nunca pegamos nas músicas já sampladas. Vamos sempre ao original e recriamos. O próprio "I Got The Power" é de um a capella dos anos 70.
BandCom: Estiveram há pouco tempo no Europavox a representar Portugal, digam lá como correu...
Fred Pinto Ferreira: Houve uma cena que eu nunca tinha visto, se não me engano foi nesse concerto, onde houve mosh mesmo.
Cruzfader: Foi uma loucura. Quase que partiam com tudo (risos)…
Sam The Kid: Gajos a tropeçar e a cair para cima do palco…
BandCom: Porque é que não conseguem tocar mais no estrangeiro?
Fred Pinto Ferreira: Impossibilidade financeira. Nós para tocarmos, não temos outro formato, mais reduzido. Somos 5, com o DJset podemos fazer uma brincadeira aqui em Portugal para curtir, temos o nosso técnico de som que é muito importante… ao todo somos 9 pessoas. São custos ainda elevados que não conseguimos suportar. Mas agora também vamos ao Brasil em Setembro para o Rock in Rio, já estivemos em Macau, na França, Holanda…vamos devagarinho.
BandCom: Vão voltar a colaborar com o Vhils ou a segunda colaboração que tinham previsto já não vai ter lugar?
Sam The Kid: É verdade, mas por acaso, neste momento, não há nada em concreto.
Fred Pinto Ferreira: Olha, eu já nem me lembrava. Mas o Vhils está completamente gigante. Tem viajado muito e não nos temos cruzado assim muitas vezes. Ficou falado, sim senhor, mas acabou por não se concretizar. O vídeo que íamos fazer não deu e agora não temos planos para fazer outro. Ele está connosco desde o princípio: antes de Orelha Negra ele já tinha atuado num concerto do Samuel...já é uma longa história.
BandCom: Já tiveram convites para criar bandas sonoras?
Sam The Kid: Eu já fiz para "O Crime do Padre Amaro".
Fred Pinto Ferreira: Eu, para um porno…
Sam The Kid: Agora vou te ser sincero numa cena, eu até não me importava, nem que fosse um filme nosso, que um de nós fizesse algo assim nada ambicioso, porque o cinema português… Por isso prefiro fazer o meu porque ao menos, mesmo não sendo nada de especial, é meu (risos)!
Fred Pinto Ferreira: Por exemplo, agora está a sair um filme, "A Gaiola Dourada", todos dizem que é muito bom…
Sam The Kid: É a tal cena, toda gente gosta só por ser português…
Fred Pinto Ferreira: Um dos meus filmes preferidos é francês, o La Haine...
BandCom: Para vós, podia ter havido mais hip-hop neste festival?
Sam The Kid: Por mim é na boa vir mais hip-hop. Mas ao mesmo tempo eu não me admiro.
João Gomes: Deve ter a ver com um certo preconceito ainda em programar hip-hop. Por causa do público, etc. Se calhar, nem pensaram nisso.
Fred Pinto Ferreira: Num concerto nosso, ou nos do Sam The Kid, nunca vi cenas de confusão. Em concertos de rock já vi, de hip-hop nunca vi.
Sam The Kid: E acho que também se deviam abrir portas a novos projetos. O Regula que está a ter um bom álbum, o NBC…também tem a ver com timings.
João Gomes: Tekilla…
Fred Pinto Ferreira: No Sudoeste temos uma oportunidade de programação, levamos Mind da Gap, Regula…
Sam The Kid: E depois esses MC’s também têm de ter um álbum relativamente recente. O Regula era uma das pessoas que ia ajudar o festival a crescer e trazer muitas pessoas.
João Gomes: Traz um público diferente mas as pessoas parece que têm um bocado de receio desse tipo de gente.
BandCom: Projetos para o resto de 2013?
Fred Pinto Ferreira: Rock In Rio, alguns concertos, continuar a promover a mixtape e o álbum. As cenas vão acontecendo a pouco e pouco. Temos algumas ideias.
quarta-feira, 28 de agosto de 2013
ORELHA NEGRA - ENTREVISTA


Mickaël C. de Oliveira
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