A edição do Milhões de Festa deste ano foi notoriamente mais "metaleira" pelo facto de os três cabeças de cartaz pertencerem a este universo estético. Apesar disso, devido à diversidade de estilos que o festival apresenta, conseguiu, mais uma vez, chegar aos mais diversos públicos e agradar-lhes de uma forma geral.
Dia 24
Entre copos, “panados gigantes” e muita boa disposição, ninguém quis faltar ao warm-up do Milhões de Festa, o festival mais apreciado do Minho. O afamado espaço barcelense Xispes acolheu a Coronado, inaugurando assim o princípio dos festejos "milhionários". Os concertos tinham hora marcada para as 21h30, mas não tiveram horário fixo para acabar. A reacção ao evento foi positiva: sinal disso foi a multidão que inundou o local. Para tal contribuiu a ementa musical que reuniu o som de ¡Caribe Mix Sistema de Soñido!, SAUR, Balão Dirigível, SPELLCRAFTER e Coronado Soundsystem, que mergulhou em músicas que só as gerações mais jovens conseguem compreender: “Let’s this party started” (Pink), “Call me maybe” (Carly Rae Jepsen) entre muitos outros temas, como clássicos dos Daft Punk. Nem a presença da polícia interrompeu as festividades e a alegria dos peregrinos que rumaram a Barcelos. Apesar de a música ter sido tocada em volume inferior a folia prolongou-se do Xispes até ao areal de Barcelinhos.
Dia 25
No dia 25, primeiro dia de festival propriamente dito, o palco em funcionamento foi o Palco Taina, situado nas margens do rio Cávado. A israelita Tamar Aphek e a sua guitarra acústica iniciaram os concertos às 18h00, com os portugueses Phase, Canzana, Cangarra e Killing Frost a ter honras de aquecimento enquanto muito do pessoal ainda não tinha chegado. Às 22h10 foi a vez dos Spacin’ subirem ao palco. Com o seu rock/garage psicadélico, proporcionaram momentos de puro prazer nos famosos “banquinhos do rio” de Barcelos. Foi um dos concertos mais esperados do dia e que fez jus às expectativas. Com músicas ora instrumentais, ora com voz a complementar, fizeram os adeptos da “taina” ficarem de papo cheio.
Com os Holocausto Canibal, de seguida e sem qualquer tipo de hesitação, foi hora de porrada e de crowdsurfing pesado. Com C. Guerra nos vocais, com “grunhidos” tão fortes, capazes de pôr o estômago dos mais fortes às voltas, Ivan na bateria, Zé Pedro no baixo e Eduardo na guitarra, deram um concerto incrível. O público dividiu-se: nos que aguentam o death grind da banda formada em 1997 e nos que ficam simplesmente atarantados com tanta barulheira e sujidade. Porém, foi um momento épico, inesperado de receber.
Os Sabre deram as boas-vindas à música electrónica numa altura em que os corpos encontravam-se em dança em puro flow na expectativa da entrada do conjunto de DJ’s que iria encerrar a noite: DJ Lynce, Pedro Beça, DJ Quesadilla e TOFU. Algo tão genial como uma junção de estilos tão diversos e tão complementares, o aniversário de Fábio Costa aka Quesadilla - o que ainda valeu umas fatias de bolo a quem se encontrava perto da grade - e o Tojó que levou toda gente às Arábias e fez as meninas parecerem odaliscas.
Dia 26
No dia 26 já a famosa piscina do Milhões, no Parque Fluvial de Barcelos, se encontrava em funcionamento. Toda a gente sabe que a piscina é o local ideal para o voyeurismo e ninguém lhe quer faltar: pois, porque se no Milhões há boa música, não faltam "Milhões de Mamas", num movimento que faz e fez sucesso na piscina e com alguns “pares” a manifestar a sua filiação.
Indo ao que realmente interessa, os JUBA cortaram a fita do Palco Piscina. Tomás, Miguel, João e Joel, todos rapazes lisboetas na casa dos 20 anos, iniciaram os banhos com o seu rock com um toque oriental e, pouco tempo depois, já a piscina se encontrava a abarrotar. Eram 4 da tarde quando a parceria de Yonatan Gat (Monotonix) e Igor Domingues (Throes + The Shine) invadiu o palco e fez variar de forma frenética a intensidade da distorção da guitarra. Pouco seria diferente com a dupla de irmãos Adorno e Papaya, ambos com o toque de Ricardo Martins dos Lobster na bateria sempre em destaque. A encerrar, Dam Mantle preencheu a audiência de dub, sendo este um final de tarde que merecia sonoridades mais dançantes para o aquecimento do festim que dali continuava. Em simultâneo com os concertos na piscina, o Palco Taina continuava bem activo com os Quelle Dead Gazelle, Waste, dUAS sEMIcOlCHEIAS INVERTIDAS e Mr. Miyagi.
Quando o sol se pôs e a noite começou a cair, enquanto uns dirigiram-se ao Palco Taina, outros ao acampamento, ao Xano, ao Xispes ou a qualquer outro tasco barcelense capaz de servir petiscos maravilhosos para a hora de jantar, os Papir abriam o Palco Milhões e Mikal Cronin o Palco Vice mas seria Jacco Gardner a boa surpresa desta noite, que na base de pop suave e uma postura inocente, tocou, cantou e encantou.
Já perto das 23h, assistiu-se a uma das mais esperadas junções já feitas em Barcelos: Black Bombaim e La La La Ressonance, no mesmo palco, ao mesmo tempo. As duas bandas, formadas por alguns dos melhores músicos barcelenses, de gerações diferentes, complementaram-se de modo a que a agressividade dos Black Bombaim se tornasse melodiosa na sonoridade caraterística dos La La La Ressonance, produzindo um som com uma carga mental fortíssima, mais pesado da responsabilidade dos primeiros e mais experimental da responsabilidade dos segundos. “Tsunami”, o epílogo extremamente monocórdico num turbilhão de flashbacks, progredindo e regredindo vezes sem conta, foi o exemplo máximo de um dos momentos mais altos do evento em que a hipnose tomou conta dos cérebros dos ouvintes.
Sem sinais de acabar, os ânimos seguiram com os canadianos Austra que, não se podendo queixar de todos os rótulos synth-pop, dark-wave, new-wave, dream-pop ou indietronica que lhes possam ser colados, contam com uma constante na beleza da voz de Katie Stelmanis, literalmente a "menina de ouro" da noite. Os berlinenses Camera seriam a outra grande surpres confirmada com o aglomerado que se juntou para os ver. Com a mesma simplicidade que toca na rua, a banda oriunda do underground não se acanhou e alcançou a plateia com riffs frenéticos e uma bateria certeira que levou a produzir o som mais espacial que estes dias presenciariam.
Como cabeças de cartaz do Palco Milhões, os Ufommamut, que ainda que uma referência para o estilo, perderam pelo excesso, pois ao fim de algum tempo esgotaram-se os argumentos, tudo parecia lento, arrastado e distorcido e uma certa monotonia tomou conta da atmosfera. João Vieira, aka DJ Kitten e líder dos X-Wife, apareceria pouco depois no Palco Vice como White Haus mostrando músicas originais e clássicos da house music que já não se fazem ouvir com facilidade. Foi uma bela maneira de acabar a noite e de aquecer a jornada até ao amanhecer.
Dia 27
À noite, os HHY & The Macumbas abriram o Palco Milhões e os Process of Guilt o Palco Vice, com o DJ set de Dam Mantle antes dos Egyptian Hip Hop a revelar-se uma ótima ideia. Os espanhóis ZA!, dotados da sua irreverência e singularidade, puseram de boca aberta todos os que ainda não os conheciam (e os que conheciam também) de tal forma que só pôde resultar num concerto tão fabuloso como aquele a que se assistiu. Abertas as hostilidades para os Eyehategod, os responsáveis por misturar originalmente sludge, doom e metal num concerto que encheu o Palco Milhões, recheou-o de momentos intensos e sintonizou os mais variados headbangers. A terminar estaria DJ Marfox que, incrivelmente, pôs todos os resistentes a dançar ao som de ritmos electro aplicados às raízes africanas.
Dia 28
A madrugada e manhã de Domingo, último dia de MdF, foi assombrada pela chuva mas de dia ninguém se deixou assustar. Apesar de a piscina se ressentir, Sequin, TORTO e os Long Way To Alaska, mesmo com alguns problemas técnicos, cerraram o pulso vitoriosamente.
À hora de jantar, Filipe Miranda, The Partisan Seed, inaugurava o Palco Milhões numa versão acompanhada com outros músicos, fazendo um apanhado do seu trabalho nos últimos anos . Seriam, no entanto, os Orange Goblin, cabeças de cartaz do último dia e mesmo sem a sua formação original, a colocar temperatura na fervura: “ninguém vai trabalhar amanhã, digam que foram os Orange Goblin que ordenaram”. Por outro lado, o momento alto e surpreendente da noite caberia aos Zombie Zombie que, com duas baterias e vários sintetizadores, mostraram o melhor do electro-pop vindo diretamente de França, e à reunião da Jibóia Experience que, a fechar o Palco Milhões, trazia uma banda rock resgatada a parte das gravitações da Coronado a revirar as influências orientais de Óscar Silva e as melodias cantadas por Ana Miró.
Na recta final, Mykki Blanco assustou os mais sensíveis com uma performance artística em simultâneo com o concerto, da autoria de Michael Quattlebaum Jr., à volta do hip-hop alternativo que pratica. El G diria, mais tarde, "podem fechar" ao Milhões de Festa entre electrónica e reggaeton que só se calaria com os primeiros cantos do galo, relembrando a todos os presentes qual a cidade que os acolheu… Até para o ano!
0 comentários:
Enviar um comentário