“Bem-vindos todos os que ai estão, não me
interessa sequer saber de onde são,
sejam
do norte do litoral(...)”
Assim começou o concerto de Virgem Suta no mítico Ritz Clube. Com dois homens e duas guitarras atrás de uma cortina de
percussões, cheios de humor para distribuir, e determinados a criar desde cedo
uma boa ligação com o público, numa casa bem cheia. Seguiu-se Ressaca, que confirmou a boa acústica
presente e deixou claro o à vontade dos músicos, que fizeram questão de deixar
o humor presente não só entre músicas, como nelas, colocando uma forte
componente teatral nas suas canções, condizendo com o imaginário criado por
estas.
Não Sou Deste Lugar deixou
claro a por vezes difícil criação de dinâmica sonora no palco, inerente à
escassez e tipo de instrumentos, que contrastou com a preocupação clara de incorporar expressividade na voz, que afirmou
o reconhecimento da sua importância. “Tomo Conta Desta Tua Casa e Exporto Tristeza foram os temas seguintes, com a guitarra de Nuno Figueiredo sempre impecável e ainda bem, visto muitas vezes
ser o único instrumento harmónico, tendo, portanto, uma importância grande na
fluidez do concerto.
Na faixa escolhida para dar seguimento ao alinhamento
escalonado para o concerto, deram um brilho muito interessante à música, e criaram mais uma vez um
ambiente a condizer perfeitamente com o sarcasmo da letra, com arranjos vocais
estudados ao pormenor, acompanhados de percussões, xilofones e shakers. Anjo em Descenção trouxe-nos uma voz melódica, que mesmo quando ligeiramente
puxada e arranhada nunca soa a blues.
De facto, já com o copo de vinho na mão e todo o público a cantar e a brindar
aos avós, em Dança de Balcão, é-nos
confirmado que pouco ou nada em Virgem Suta soa a anglicismos, ou,
mais especificamente, a pop-rock anglo-saxónico.
Pelo contrário, temos a sensação que estamos num bailarico sofisticado, com
tangos e fados numa qualquer rua de Lisboa (não por acaso escrevi “Bairro Alto
” e “Festas dos Santos” no meu caderno, como metáfora para o artigo). Em Linhas Cruzadas pôde-se
sentir a empatia enorme que houve no público ao longo de todo o concerto. Era
visível um sorriso em cada pessoa. Não deixou de ser curioso, no entanto, o
perfil do público presente, sendo muito difícil encontrar alguém abaixo dos 25
anos. Seria do preço dos bilhetes? Do género musical?
Beija-me na boca foi
a que menos agradou, a entrar no terreno da pop
segura e da previsibilidade. Bom para quem está alegre, e pouco mais. Maria Alice, no entanto, seguiu-se para
me compensar, numa homenagem (escondida pelo humor) às mulheres que foram
filhas do nosso Portugal salazarista e dos velhos sós. Deu-se lugar para os covers:
Absolutamente, de Carmen Miranda, e Playback,
de Carlos Paião. Mais uma acha para atear um público já
ganho há muito, mas que precisava de balanço para mais algumas músicas.
Seguiu-se uma breve pausa e uma tentativa inconsequente de
fazer prever uma última música. Antecederam Bárbara
e Ken, uma balada que, na minha opinião, se ouviu mais bonita vinda do
palco que da versão em estúdio. Ainda houve tempo para Se Deus Quiser, Luso Gentleman, e Mula da Agonia. A noite acabou com a repetição de Tomo Conta Desta Tua Casa, com músicos
cansadíssimos, grande ovação final e caras felizes à saída.
Um concerto de músicas aparentemente simples, que valeram
pela sua simplicidade e arranjos melódicos, onde o menos foi o mais. Uma casa
cheia, que cantou quase todos os temas de fio a pavio, e mais parecia uma família,
e um cheiro a Portugal que permite, como o manjerico, cheirar a música tradicional,
sem nunca tocar nela.
Texto por Hugo Hugon,
Fotografias por Catarina Abrantes Alves
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