Dois anos depois do seu último concerto no
Porto, os Orelha Negra encontraram no seu regresso triunfal à Invicta uma
excelente sala totalmente esgotada do Hard
Club, que os aguardava ansiosamente em ambiente de celebração. Uma hora e
meia de concerto soube a pouco para colmatar essa ausência que se tornava já
demasiado longa.
O quinteto apresentou um alinhamento renovado, juntando a alguns
inevitáveis clássicos como A Cura ou M.I.R.I.A.M., algumas delícias do seu
segundo registo como Bala Cola, 24/7, Polaroid e Viva Ela (com
um trabalho fabuloso do Fred na
bateria) e incursões no novo Mixtape II, o álbum fresquinho, já
disponível em diversas versões por essa net fora, com reinterpretações de
músicas do segundo álbum, acompanhadas por um quem-é-quem dos melhores
vocalistas e MCs portugueses da
actualidade como Mónica Ferraz, Capicua e Valete ou o americano Amp
Fiddler.
O ambiente electrizante que criam desde a
primeira nota é constante e contagiante e a máquina move-se com uma fluídez que
não julgavamos possível num colectivo que, nos registos de estúdio, se alimenta
vorazmente das sonoridades características do hip-hop. Ao vivo, a banda não necessita de
vocalista(s) para injectar alma nas melodias que conhecemos e repetimos
incessantemente nos nossos gadgets e
o poder da bateria do Fred é o
perfeito metrónomo para uma sonoridade surprendentemente orgânica e una,
impecavelmente equilibrada entre o scratch
de primeira do Cruzfader, os samples e os beats disparados pelo MPC do Sam
the Kid, o baixo maravilha do Francisco
Rebelo e as teclas talentosas do Diogo
Santos, que substituiu na perfeição João
Gomes, actualmente em digressão com Ana
Moura por esse Mundo.
Sem quaisquer pausas entre as músicas, a
experiência torna-se ainda mais intensa e a cumplicidade que se sente nos
pequenos esgares e sorrisos entre os cinco transparece na forma aparentemente
fácil como parece que assistimos à criação de músicas de raíz, tal é a
vitalidade com que nos chegam. O segredo? A capacidade de fundir bom gosto e
talento ímpar no uso, em tempo real, dos samples, beats e scratch com um motor soul
de alta cilindrada.
Como bónus para as apresentações ao vivo, os Orelha
Negra brindam-nos com o que eles singelamente apelidam de medley, em que, com o seu toque de
Midas, juntam à festa convidados tão especiais como o Sure Shot dos Beastie Boys, I put a spell on you, do Screaming
Jay Hawkins, Yegelle Tezeta, do Mulatu
Astatke, Otis de Jay-Z
com Kanye West ou a mítica Todos Gordos, dos portuenses Mind da Gap, confirmando
apenas o que todos já sabiam: para além de talentosos, trazem na bagagem um
repertório que excede em muito o que se poderia esperar de qualquer outro
colectivo da mesma área musical. Os Orelha Negra são únicos em qualquer parte do Mundo e ao
vivo superam-se de uma forma incrível. O Mundo é deles. Basta que o
queiram.
Texto por Paulo Silva,
Fotografia por Raquel Lemos
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