quarta-feira, 6 de março de 2013

O Martim - Em Banho Maria (Azáfama, 2013)



Temos o Martim Torres, o bom rebelde. Um talento grande, um músico na verdadeira acepção da palavra e com muita vontade, pois claro está, de fazer música. Um amante e estudante de música altamente indisciplinado, como quase todo o bom artista é. Depois, temos O Martim, que começou como um confessionário do Torres e hoje é um projecto, uma banda, um grupo que vai tocando ao vivo e que teve participação no primeiro trabalho de Martim Torres, Em Banho Maria, o qual, passando por várias fases, teve a sua origem no estúdio caseiro do próprio.


Arregacemos as mangas, então: O Martim, no seu Banho Maria, fala de temas e episódios brilhantemente escritos. Conta histórias de um Martim, o ser que dá vida ao personagem. Um ser que não tem sorte nenhuma. Coitado. A vida deste homem é uma "cansativa abstinência" que ele "pratica diário", excertos que pertencem ao seu single de avanço que dá nome ao álbum. A temática resumidamente fala da derrota de um rapaz que não tem sorte no amor.
 

Carregado de ironia, clichés, graça e escárnio... Contém derrota, vazio e deambulismos. As letras de O Martim são o que de mais precioso este disco contém. O jogo de palavras é simplesmente brilhante e aparentemente este, o Martim Torres, nem o pratica muitas vezes. Nunca se resolveu a escrever até ter pensado num disco a solo. Martim Torres comprova neste disco que, além de um músico de excelência, é um poeta divertido. O registo conta a história de um Martim que "can't get laid" (desculpem-me o estrangeirismo) e retrata assim a frustração e azar nessa grande dor de cabeça que é o amor… Tão frustrado e com tão pouca sorte que O Martim já nem sabe o que é "fazer missionário". Mas sendo este um tema sensível e doloroso para qualquer pessoa que passe por situação idêntica, e que provavelmente andaria triste e deprimida, Martim conta a sua história de um jejum maior que a temporada de quaresma, num ritmo rock n’ roll com acelerados bass runs no refrão, lembrando-nos ao mesmo tempo de grandes clássicos do rock. Quase dá vontade de exclamar "que pica! Venham mais azares na vida deste Martim para nós dançarmos". E assim vai ele, O Martim, gasto, cansado e triste…


Vai assim a deambular para o Cais do Sodré, sítio que o acalma e onde gosta de estar... Acompanha-o um riff de guitarra que soa familiar, mas que encaixa e lhe dá a mão no seu passeio que começa no eléctrico número 18 e termina a pé… Sem “pressa de chegar”, mas com muita “para não sair”. Com um refrão catchy, canta e ecoa em nós um semelhante sentimento: “no Cais do Sodré, onde um homem vai perder a fé. No Cais do Sodré eu sou o último a ficar de pé”. É certamente um sítio para afogar as mágoas, caro Martim.


Por estes passeios, mágoas e chutos nas pedras da calçada, O Martim faz as pazes com a ausência e despede-se em “Cafuné”… Aprende a lidar com o adeus, e ensina-nos ao mesmo tempo… Diz, quase que grita e repete, “eu não te vou fazer mais Cafuné”, deixando o critério de entender o que as palavras escondem a cada um de nós… Será que o Martim assimilou e percebeu que já não vai fazer mais cafuné? Ou fá-lo em tom vingativo? Isso não sei, mas agrada-me o ritmo desta música que embala e conclui, desperta e assenta.


O disco de O Martim é um disco onde se encontra algo, apesar de não se conseguir definir muito bem o quê. Daí talvez o nome Em Banho Maria. Porém, não se deixem enganar. Neste disco temos rock, blues e soul numa marca muito própria em termos sonoros, com homenagens a Poetas, tudo isto dentro da linha registada do Martim mas que, aqui e ali, precisa de um ou outro ajuste. Martim Torres é um músico completo e antes deste projecto a solo andou por muitos outros. Talvez por isso se notem tantas influências musicais neste disco, regadas quase sempre com o som da caixa de ritmos de que ele tanto gosta. A voz saturada, em certas alturas até mesmo distorcida, denota um Martim que possivelmente procura maneiras de disfarçar um “desvio” na harmonia, mas que por um outro, lado ao longo de 9 faixas, poderá cansar um pouco. Em contrapartida, a maneira como canta é muito peculiar, diferente e divertida e que de propósito ou não, por vezes se assemelha a B Fachada na entoação e terminação de frases. Aliás, o disco termina com um tema intitulado Tu não és o B fachada onde o cantautor diz que “só há um (B) no universo”, demonstrando assim a clara influência e inspiração que consegue em B Fachada. Contudo, também o próprio Fachada tem mão neste trabalho ao misturar duas das canções deste Em Banho Maria: Belzebu meu amor, uma das primeiras canções escritas e compostas por Martim Torres, e Cafuné.


Talvez as coisas na vida de O Martim melhorem e um segundo disco contenha conquistas e vitórias, e que o próprio volte renovado sabendo o Kama Sutra de trás para frente. Caso não tenha de facto sorte, nós estamos solidários e, não nos leves a mal Martim, não nos importamos nada. Apesar de muitas coisas más, ainda tens o teu Honda, que fazes questão de nos apresentar em Honda Blues (magnífico, já agora), que te alegra o dia e nos provoca uma certa inveja. Muita força, Martim! 
Tomás Anahory 




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