sexta-feira, 22 de março de 2013

DAVID FONSECA @ COLISEU DO PORTO, 9/3/2013 - REPORTAGEM




Falar de David Fonseca, pelo menos para este humilde melómano que vos escreve, é recuar mais de uma década aos tempos em que uma banda ainda desconhecida de Leiria lançava, em 1998, uma cover dos Erasure no éter, ganhando pouco depois o Termómetro Unplugged (quando vencê-lo era realmente relevante e era sinónimo de lançar uma carreira) e pôs o panorama musical português a salivar por mais. Os Silence 4 viriam a triunfar com as suas canções simples, quase ingénuas, num inglês que soava a melodia do flautista da Hamelin para toda uma geração que ansiava por ouvir as suas angústias, amores e desamores cantados por uma música portuguesa que cada vez mais os esquecia.

Entre os quatro leirienses, desde cedo se destacou o seu carismático líder David Fonseca. Com um percurso cuidado e inteligente, desde o início manteve-se fiel apenas a si mesmo, com uma linguagem pop dotada de muito mais de universal do que propriamente português. Talvez seja este o segredo para, cinco álbuns e dez anos de carreira depois, ter sido capaz de permanecer consistentemente no topo, quer em vendas, quer em popularidade.
A geração que o ouvia no início acompanhou a sua evolução como músico e performer e  David cultivou sempre essa relação de proximidade e simpatia com os fãs, quer pela música que foi criando (num crescente de complexidade e criatividade, conseguindo dessa forma adaptar-se às mudanças nas preferências do seu público que ia evoluindo e às tendências da pop), quer pela utilização frequente das redes sociais, como forma de obter reacções em tempo real da multidão de anónimos que o segue e de partilhar conteúdos exclusivos e personalizados.

A noite de 9 de Março no Coliseu do Porto foi de celebração dos 10 anos da sua carreira a solo, por onde passaram quase todos os êxitos essenciais, acompanhados de alguns mimos e surpresas para uma plateia que quase esgotou a mítica sala portuense. Dez anos antes, à meia noite de 10 de Março de 2003, era lançado em 150 rádios simultanemente o primeiro single do seu primeiro álbum a solo "Someone that cannot love". O seu álbum duplo "Seasons: Rising/Falling", de 2012, (cuja ideia inicial era ser quádruplo, um álbum para cada estação do ano), é um díptico que procura retratar a vida durante um ano, com todas as suas cambiantes de clima, disposições e ambiências, servindo de ponto de partida e centro nevrálgico de todo o espectáculo.
Durante mais de 2 horas, assistimos à reprodução dessa panóplia de emoções através do jogo de luzes, com uma paleta de cores correspondendo ao que ia sendo tocado, associada a um alinhamento inteligente e cuidado, capaz de manter o ritmo e expectativa até ao final e superando as expectativas dos fãs mais acérrimos e fiéis.
A meio do espectáculo, David senta-se ao piano e improvisa com o público uma música a que chama de "Coliseu", o mesmo que, mais uma vez, consegue que o acompanhe em uníssono.
Um pouco mais tarde, a banda abandona os instrumentos eléctricos e senta-se em círculo, simulando um ensaio. Daí a nada, entoava-se o hino do Verão passado "We Are Young" dos Fun, como mera introdução para uma versão completamente "despida" de "What Life Is For", o single de apresentação do álbum mais recente de David Fonseca que foi lançado através de uma campanha publicitária de uma operadora de televisão.
Enquanto canta "Stop For A minute", David não resiste a conviver mais de perto com o público e desce à plateia com a sua guitarra, para depois subir à tribuna e surpreender novamente com a sua espontaneidade.

Terminado este período de maior intensidade, cai a cortina negra e David surge em palco vestido de Mr. Scrooge antes de se deitar. Sentado ao piano, a pretexto de uma história que envolve uns telefonemas misteriosos, canta para um auscultador telefónico alterado para microfone uma versão de "I Just Called To Say I Love You", para em seguida arrancar com uma excelente revisão do clássico dos Nine Inch Nails "Hurt", que termina já acompanhado por toda a sua banda.
Algumas músicas depois, a vontade dos seus fãs expressa via-Facebook é cumprida e David Fonseca presenteia uma plateia já rendida com uma versão mais pop do hino dos Nirvana "Lithium", devidamente vestido com a sua velha camisa de flanela.
Seguiu-se a grande "The 80's", que transforma o Coliseu numa discoteca gigante e o regresso para o encore com "U Know Who I am" e o final apoteótico, repleto de papéis prateados e balões, com uma "What Life Is For" em toda a sua pujança pop.

Terminada a celebração, torna-se fácil perceber como David Fonseca se tornou um artista consensual, com tudo o que de melhor essa palavra pode acarretar. A sua estética vincada, apesar de personalizada, tem, desde o início da sua carreira, uma qualidade superior e um alcance que vai dos 8 aos 80 anos. A multidão que o recebeu de braços abertos e vozes afinadas na Invicta foi o retrato perfeito dessa diversidade geracional mas simultaneamente da comunhão em torno de uma música que se sabe manter sempre viva e relevante, o que, em plena era de massificação de tendências e proliferação de imitações de mau gosto, é um achado inestimável. E é nosso.
Venham mais dez, David.

Paulo Silva
Créditos da fotografia:
Ana Alves Guedes  (www.viverfestivais.com)




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