terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

SUN GLITTERS - ENTREVISTA


De passagem por Paris no âmbito do evento "Luxembourg Sounds Like..." organizado pela Music :LX e o Nouveau Casino, o artista lusodescendente Sun Glitters encantou o público francês e espalhou as suas ondas positivas com cor, paixão e emoção. Victor Ferreira também teve algum tempo para falar connosco sobre o caminho que percorreu enquanto Sun Glitters e o sucesso que está a ter pelo mundo fora.

BandCom (BC): Quando te conheci, fiquei surpreendido quando soube que só tinhas iniciado a tua carreira com Sun Glitters em Março de 2011… Com tantos EPs, remixes… Um verdadeiro hiperativo !

Sun Glitters (SG): Tento ficar no comboio. Se tu paras… Bem, por vezes é bom parar de vez em quando… mas enquanto sentir essa força vou continuar. Sou assim.

(BC): A nível de influências: Burial..?

(SG): Sim, usei isso porque é a tal parte que tenho na minha música e que me influenciou imenso, a parte das vozes quando começo a trabalhar com elas. Agora a nível de música, não tenho nada a ver com ele. O que ele faz é muito diferente do que eu faço. Continuo a ser um grande fã de My Bloody Valentine, dos The Cure e Boards of Canada na música eletrónica.

(BC): O facto do Pitchfork ter nomeado um dos teus trabalhos como música da semana foi um grande empurrão para a tua carreira…

(SG):Foi. Talvez não a 100%... mas a 90%, sim. Abriu-me muitas portas. Agora tenho muito mais apoio, já apareci no "The Fader" por exemplo, entre outros, e também gosto muito dos blogues ditos mais amadores, porque ajudaram-me muito a avançar. Começaram a gostar da minha música e nunca mais me deixaram.

(BC): Houve uma pequena história com um colega teu que te disse que se aparecesses nos três blogues que ele te ia aconselhar, aí a tua carreira ia ter um verdadeiro "boom"...

(SG): Tu segues-me bem… (risos) Isso aí é uma coisa de que raramente falei. Foi mesmo no início da minha carreira, é um detalhe muito importante. Trata-se de uma pessoa que já conheço há muito tempo, com quem comecei numa editora e em quem posso confiar, sobretudo do ponto de vista da crítica. Muito sincero. Se ele me disser que algo não funciona, é porque não funciona mesmo. Ele assistiu a um dos meus concertos, mesmo nos primeiros tempos e disse-me : "olha isto não dá, isto pode dar mas tens de ir por aqui, etc…".
E depois, aconselhou-me muito e disse-me: "se conseguires convencer estes três blogues…" E eu apostei nesse efeito "bola de neve". Se formos a ver, ele não errou…


(BC): Gostaria que explicasses com termos simples o que é para ti "shoegaze", "chillwave"?

(SG): O que eu faço, de maneira muito mais simples, é música eletrónica. Agora, quando falam de música eletrónica, as pessoas pensam logo em techno, rave e essas coisas. O meu estilo de música eletrónica tem uma grande influência rock, misturo muito esses dois estilos. No shoegaze utilizam muito esse efeito nas guitarras, muito reverb, que vai criar
aqueles muros de som...chillwave é esse movimento misturado com música eletrónica, com aqueles antigos teclados, o antigo misturado com o mais moderno.





(BC): O que é que te levou a fazer este tipo de música ?

(SG): Não escolhi. Tive um outro projeto de música eletrónica durante alguns anos mas estava à procura de uma nova direção para este projeto. Eu faço música de maneira natural e nesse momento ouvia muita chillwave, witch house e se calhar foi o que saiu nesse momento ao fazer a minha música.

(BC): O chillwave não está a virar moda ?

(SG): Acho que já virou. É um efeito de moda que ainda permanece mas já mais levemente. As referências ainda estão bem presentes. Mas é como o dubstep. De um momento para o outro toda gente se pôs a fazer dubstep e neste momento penso que o dubstep está mais ativo que o chillwave.

(BC): A primeira vez que assisti a um live act teu foi depois de um live act do Benga… aquela sensação de passar de um banho de água a ferver para um banho de água fria… da fúria ao apaziguamento...

(SG): Muita gente me fala disso. Até já me disseram que havia pessoas a chorar (não quero estar a gabar-me). Mas o que faço é apenas a minha música e gosto de a fazer. É uma coisa que vem do fundo do meu coração. Tento tirar tudo o que tenho em mim e transpô-lo para a minha música. O que acho que consegui foi criar sons muito positivos, que tocam as pessoas.

(BC): Já me disseram que a tua música tem algo de "malsain"...

(SG): Isso também pode ter outra explicação. Já me perguntaram o que é que podia ser a minha música e eu disse: como português nascido e a viver no Luxemburgo, podes comparar o sol com a chuva. No Luxemburgo chove muito e acho que na minha música se sentem esses dois lados, a chuva com o sol, a melancolia com a alegria. E é talvez essa tristeza que pode dar à música um lado mais dark. Agora a nível de imagens, há muitas coisas que eu próprio não escolhi. As coisas vieram assim. As pessoas começaram a fazer vídeos para mim, sem eu saber…vão buscar aquelas imagens de filmes e já vi que aparecia muito sexo, de maneira erótica, também filmes de horror com muito sangue…
Para mim, foi uma surpresa. Esse lado mais escuro entrou na minha música e faz agora parte da minha identidade. Há também outras razões
: não mostro a cara da minha filha 
porque não quero expô-la...


(BC): Também não gostas muito de te expor…

(SG): As pessoas têm de gostar da minha música como ela é. Eu sou simplesmente aquele que a faz, não sou nenhuma boys band, mas também nunca fiz nada para me esconder… Tinha aquelas fotos no iPhone, da minha filha, e comecei a criar uma certa identidade. Eu queria que fosse uma imagem que mostrasse Sun Glitters e não eu. A minha música é também um filme que se passa em frente a mim, gosto de ouvir a minha música quando estou de carro, de comboio…mas nunca é diretamente "malsain". Há sempre aquela ambiguidade. É erótico, não é sexo. Nunca é explícito. Há sempre algum mistério.

(BC): A tua filha, o que é que ela acha das tuas músicas ?

(SG): Ora bem, "eu faço a melhor música do mundo" (risos). Tenho três filhos. Adoro-os, eles também me adoram, gostamos de fazer coisas juntos. Gostam de ter um pai criativo. Aliás eles próprios já parecem ter essa fibra. Por vezes, até fico de boca aberta. Com os meus filhos aprendo coisas novas e eles motivam-me muito: "une source d’inspiration". Ficam muito contentes quando uso fotos deles; já aconteceu estarmos no carro e ouvir lá atrás umas melodias. A minha filha mais nova já apareceu numa canção minha que ainda não saiu, onde criei com a voz dela uma melodia…já começa a colaborar sem saber (risos).

(BC): Isso é trabalho infantil…

(SG): Sim mas acho que este é positivo…

(BC): Usas sempre o teu iPhone, és designer gráfico, estás sempre online nas redes sociais…O que é que mais te faz falta quando tens quase tudo o que um músico 2.0 precisa ?

(SG): Eu faço isso porque é muito importante eu ter lá as mãos, simplesmente porque está a funcionar bem. É preciso aproveitar esta oportunidade porque não quero perder o comboio outra vez. Mas mesmo assim, já fiz imensas colaborações. A nível de artwork, não tenho necessidade. Não é porque eu sei fazer, mas porque sei o que eu quero. Agora se encontrar alguém que diz que quer fazer e que não preciso dizer mais nada, em que "ela entrou em mim"...não tenho problemas com isso. Mas se eu continuar a fazer Sun Glitters com 80- 90 anos, se calhar vou precisar de ajuda em certas coisas… (risos) E também tenho colaborado com algumas pessoas para sair do dia-a-dia e a coisa não se tornar demasiado monótona.





(BC): Em Portugal, com quem tens "boas relações"?

(SG): Os :papercutz, somos amigos. Não conheço muitos artistas portugueses. O IVVVO, o João de Almeida (Elite Athlete)...conheci uma banda portuguesa quando toquei em Itália, os PAUS. Gostei muito do concerto deles.

(BC): És também um dos porta-estandartes da música luxemburguesa. Fala-nos sobre este evento no Nouveau Casino ?

(SG): Sou português mas também me considero luxemburguês porque nasci e moro no Luxemburgo. Isto é um projeto do Music :Lx que eles têm no Luxemburgo, um "Bureau d’Export". Eles atualmente estão a pegar nos artistas nacionais com maior potencial e a tentar mostrá-los aos estrangeiros, porque toda gente vê o Luxemburgo como o país dos bancos e não pensa que também se faz boa música lá. E criou-se este "Luxembourg Sounds Like...".

(BC): Tu que conheces bem a música luxemburguesa: « Natas Loves you », não tem nada a ver com as Natas portuguesas ?

(SG): Não (risos), acho que não.

(BC): E os Mutiny on the Bounty? Eles têm uma canção intitulada « Cruz Candelária »…

(SG): Sou muito mau a recordar nomes…mas eles não têm contacto nenhum com Portugal. Mas sabes que no Luxemburgo também se criou muita coisa porque estão a viver lá muitos portugueses, uma grande comunidade que já lá nasceu, que conviveu com os habitantes luxemburgueses, talvez essas coisas possam ser a conclusão de uma "mestiçagem"…




(BC): Disseste que os lives ajudaram-te a ser melhor músico. Em que medida ?

(SG): Não aprendes tudo também. O que eu aprendi foi que tinha de exprimir através de movimentos que estava a sentir a música e que não podia ficar parado detrás do computador para transmitir uma certa mensagem. Comecei a conhecer muito melhor as minhas máquinas, tive novas ideias… muitas músicas que toco agora ao vivo mudaram por causa do live. As canções transformaram-se um pouco, mas não foi assim que aprendi a ser bom músico: isso foi com o passar dos anos. Com os remixes também aprendes muito "ah, ele faz isto assim, interessante!". Nos lives aprende-se a "sentir". Não é a mesma coisa que quando estás trancado em casa, sem ver a reação das pessoas.

(BC): A parte visual nos teus lives é pensada antes ou na hora ?

(SG): Os videoclips: tenho alguns já feitos. Ao vivo, uso algumas vezes os videoclips, mas também depende muito do momento e daquilo que estou a sentir; já me aconteceu mudar de planos e escolher outro videoclip da minha lista. E acho que eles têm basicamente todos a mesma mensagem. Se trocar um por outro numa música qualquer, acho que as pessoas não iam dar por ela.

(BC): Hoje tens a sorte de estar aqui no Nouveau Casino. Mas se te disserem "olha hoje, esquece o lado visual", o que fazes ?

(SG): Já aconteceu. Já estou preparado para este tipo de "problemas técnicos" ou problemas de espaço...já toquei em salas pequenas. Aí tens de optar por outra tática, pensar em transmitir as coisas de uma maneira diferente. Aconteceu poucas vezes, mas até correu bem. Acho que a minha música tem também essa capacidade de só por ela dar azo a muita inspiração, sem ter aquela necessidade de ter videoclips. Quem gosta da minha música fecha os olhos e deixa-se ir.

(BC): Já tens outras datas agendadas para França/Portugal ?

(SG): França, não. Mas podem aparecer outras oportunidades hoje. Para Portugal tenho duas datas, em Portalegre e na Figueira da Foz, num festival. Ainda estou à espera dos detalhes mas penso que o festival terá lugar no início de Agosto. Agora, vou voltar à Rússia, à Roménia, à Áustria…

(BC): Uma mensagem final?

(SG): Que as pessoas sejam positivas. Se as pessoas só vêem o lado negativo é talvez também porque não querem vê-lo de outra forma. Que ouçam a minha música, que a curtam…e se não curtiram, obrigado por terem tentado! Que continuem a apoiar todos os artistas porque ser músico nem sempre é fácil…



Mickaël C. de Oliveira




0 comentários:

Enviar um comentário

Twitter Facebook More

 
Powered by Blogger | Printable Coupons