Emmy Curl
apresentou-nos em Novembro de 2012 (ano generoso em trabalhos) o seu último EP,
"Origins".
Um conceito artístico muito vincado é
a marca deste trabalho: muito visual, muito excessivo, muito trabalhado. Quando
ouvimos a primeira música de "Origins" sabemos o que vamos ouvir no
resto do EP. Sentimo-nos continuamente
rodeados, abraçados, por sons de sintetizadores lapidados até à ultima aresta,
guitarras aéreas e efeitos hipnotizantes, que se acompanham de "beats" mais ou menos
minimais, uma voz angelical e uma
produção irrepreensível. Damos por nós numa paisagem bucólica, enquanto uma
mancha (que aos poucos vamos reconhecendo e interiorizando como nossa) de
frequências que nos entram pelo ouvido e por lá ficam, ressoando, esperando a
próxima subida, a próxima descida, balançando em refrões subaquáticos e
submergindo para voar em melodias límpidas, paradoxalmente envoltas em
nevoeiro.
Temos a
sensação de que as músicas nos são dadas, que tudo o que precisamos é de as
sentir.
Tudo isto seria uma pérola, se não
fosse o facto da sua complexidade a nível sonoro acompanhasse algo simples a
nível de conteúdo. O contínuo abraço sonoro torna-se desconcertantemente difuso
ao fim de algum tempo. Os sintetizadores, efeitos e "beats" são
"perfeitos", mas quando nos abstraímos da sua surpresa/magia inicial,
percebemos que foram retirados de uma fórmula musical pensada para caber numa construção
minuciosa de delicadas peças construída em antecipação. O problema reside na
validação dessa construção em antecipação, e na sua repercussão no novelo
musical construído.
Novelo
demasiado visível, onde não se vêem fios soltos, revoltados, cruzados ou de
cores diferentes. A sensação de que algo irreal nos está a ser apresentado é
constante, irreal no sentido em que o seu
conteúdo é focado demasiado na técnica. Técnica para fazer transparecer
algo assente sobre uma imagem
pré-definida e demasiado vincada, que marca todo o EP e lhe dá uma sensação de
"todo", mas lhe retira a sensação
de continuidade (onde vivem pequenos momentos de espontaneidade, que nos
alertam e nos dão vida sorrateiramente), e que faz sobrevir, exista ou não, um
sentimento de conformação.
A interpretação de Emmy Curl é coerente com todo o
trabalho, de uma forma honesta faz jus àquilo ao vamos interiorizando, mas não
nos faz nunca sair do nevoeiro, e nós percebemos porquê: porque ela não quer.
Tudo isto não deixa de hipnotizar, mas hipnotiza porque nos desarma,
tratando-nos demasiado bem, apenas enquanto nos deixamos a ouvir.
Podemos ter como contra-pontos o EP
"Birds Among Lines", onde essa
honestidade que ecoa sempre na voz de Emmy é expressa agora como uma força
criativa muito mais terrena, embora possa transparecer algo etéreo, e a
simplicidade musical é contagiante e tocante, contraposta pela complexidade na
sua interpretação. Ou em Deep:Her, em que uma obra prima de descomprometimento
excessivo (que sabe da sua própria existência) para com o processo criativo,
nos move para essa continuidade de loucura que nos embriaga, e em que não
temos que pensar que estamos num "todo", simplesmente vamos estando,
algo que senti falta em "Origins".
Este é um EP surpreendente, hipnotizante, depois letárgico, perfeitamente engendrado
num arco-íris mecânico. Falta-lhe Vida na técnica, maleabilidade na construção.
Hugo Hugon
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