segunda-feira, 16 de julho de 2012

Amarionette - Num dia mau consegue ver-se para sempre


Antes de começar a minha análise a Num dia mau consegue ver-se para sempre, queria apenas aconselhar-vos do seguinte: comprem o álbum e quando se forem preparar para o ouvir peço-vos que coloquem um chapéu. No fim de o escutar, estou certo que esse mesmo chapéu não estará colocado em cima das vossas cabeças. Ah, e isto não é para meninos. Porém, não estou aqui para vos falar do que devem ou não fazer, nem tampouco do que devem ou não vestir. Por isso, prossigamos para o que realmente interessa e tudo o que hoje realmente nos interessa são os Amarionette.


Os Amarionette, banda do Seixal formada em 2007, são formados por um quarteto composto por João Ortega, Joana Vieira, João Galrito e Miguel Loureiro. Apesar de já contarem com cinco anos de existência, é somente agora que o quarteto se estreia na rodagem dos LP’s. Fazem-no com Num dia mau consegue ver-se para sempre, e, diga-se, melhor estreia era (quase) impossível. O primeiro LP da banda do Seixal traz-nos 9 desconcertantes faixas e é condimentado unicamente do dialeto de Camões, o que salienta, a meu ver, um dos muitos aspectos positivos que os Amarionette nos têm para oferecer. Cinco anos de espera, cinco anos na ignorância de saber o que faziam este quarteto, cinco anos passados (completamente) ao lado.

Liricamente, Num dia mau consegue ver-se para sempre, é indubitavelmente um dos melhores discos portugueses que me recordo, apesar de nem todas as letras serem da autoria da banda. Digo-o sem hiperbolismos. Faixas como, por exemplo, Alberto Caeiro, escrita por João Galrito, e A scena do ódio, a faixa que serve de desenlace para o registo e que retrata um poema da autoria de José Almada Negreiros declamado por Charles Sangnoir, revelam-se uma autêntica ode à poesia e cimentam o lirismo como um dos pontos mais fortes da banda lisboeta. Focando-me na vertente sonora, poderia ficar-me apenas por dizer que a sonoridade dos Amarionette é como uma espécie de orgasmo sonoro. A fusão que ocorre entre o elóquio declamado, quase sempre, por Joana Vieira, e o som rasgado e sem medos é simplesmente arrepiante. Sonoridade pautada pela loucura instrumental, que parece querer-nos preencher a alma de tão vibrante, fria e concitante que consegue ser. 


Na indústria musical, nunca é fácil primar pela originalidade. Por muito que se queira ser original e fugir a rótulos, a verdade é que nem sempre se consegue isso. Aqui, trata-se de um caso mui peculiar. A banda bebe das melhores fontes, mas consegue-se esquivar de rótulos com uma sapiência extraordinária. As influências são imensas: aquele post-rock mais vibrante e ousado, sem medos, produzido, por exemplo, por Mogwai ou This Will Destroy You. Os 90’s fragmentados com pequenos traços de bandas como Sonic Youth. Existe um experimentalismo desinibido, que vive incondicionalmente em cada música do registo. O psicadelismo vive em faixas como A scena do ódio, e relembra-nos nomes como The Doors. Falando em nomes portugueses, a comparação é óbvia: Linda Martini vem logo à cabeça. Portanto, influências são imensas mas o modo como os Amarionette mesclam todas elas acaba por conceder tamanha originalidade (e até alguma inovação, tendo em conta o panorama musical português).

Assinalando os pontos fortes do registo, devo OBRIGATORIAMENTE referir três faixas: a monumental e excelsa composição lírica maravilhosamente musicada em Alberto Caeiro, a penetrante e fenomenal, e também onde Joana Vieira aparece melhor que nunca, Monstros de ninguém, e por fim, a faixa que, porventura, é talvez a música favorita de todo o registo, a assombrosa Polaroid, uma faixa simplesmente arrasadora.
Quanto aos pontos fracos… Aliás, quanto aos pontos menos bons, devo referir algum delay que existe ao longo do registo e, também, a alguma notória falta de coesão que existe em Num dia mau consegue ver-se para sempre.


Em compêndio, Num dia mau consegue ver-se para sempre, é um disco da outra galáxia. Confesso que já tinha saudades de ouvir algo desta qualidade e dentro deste estilo. Post-rock sem medos, a viver incondicionalmente na sombra dos 90’s ou no pesar do experimentalismo e do psicadelismo, onde a música não é só música, mas ultrapassa a fronteira e se transforma em mensagem. Já têm o vosso chapéu à mão?



Nota Final: 8.5/10


Emanuel Graça




0 comentários:

Enviar um comentário

Twitter Facebook More

 
Powered by Blogger | Printable Coupons