sexta-feira, 6 de maio de 2011

Maria João - ENTREVISTA

Como surgiu o nome tão engraçado para este álbum?

É uma gulodice, eu sou gulosa e este disco é sobre isso mesmo (risos), gosto muito de fruta. Também gostava muito de chocolate, como se viu (no álbum anterior com Mário Laginha).

Considera que a música é doce, não só para si mas para quem a ouve?

É uma boa música. Boa, saudável e gostosa música! Acho que é um bom nome, é óptimo pegar em coisas que gosto e juntá-las à música.

Não é a primeira colaboração que faz com uma orquestra..

Sim, mas é a primeira gravada em disco.

Conte-nos mais sobre as anteriores colaborações deste tipo, em que já teve parte.

Nós (Maria João e Mário Laginha) fizemos a primeira com a orquestra de jazz do Hot Club, numa série de concertos. Também fiz com a orquestra da rádio de Hamburgo, que nunca foi para disco. Outra foi a Brussels Jazz Orchestra, com eles já fiz um disco, que deve sair para 2013. Este foi verdadeiramente o primeiro disco com uma orquestra, foi gravado no ano passado.

O trabalho feito com a Orquestra de Jazz de Matosinhos (OJM) é muito diferente dos anteriores?

Sim, não tem nada a ver com o que foi feito com as outras orquestras. É outra coisa, é um pretexto específico para esta orquestra, para este projecto. A OJM convidou-me para fazer um concerto com eles na Casa da Música e daí nasceu este trabalho. Escolhemos música que gostávamos e a base foram os standards: americanos, brasileiros.. e os meus standards também! Neste disco não foi feita nenhuma música original, que é o que eu sempre fiz. À excepção do primeiro álbum, e mesmo o Chocolate, que foi pensado para ser um disco de standards, tem músicas originais. Este foi feito para, assumidamente, cantar música standard, que ja existe, a música dos outros, de certa forma.

De que forma muda a composição de música com uma orquestra em relação a fazê-la com o seu companheiro musical, Mário Laginha?

As formações mais pequenas são diferentes, são mais fáceis. Ter uma orquestra com 17 músicos a fazer música provoca variações a nível do timbre, há mais timbres em palco ou na audição, há toda uma série de instrumentos que não estão lá quanto o Mário toca comigo. A gestão do espaço é obviamente mais fácil quando estou apenas em duo, aliás é a minha versão preferida, eu gosto de estender para todo o lado, como se repara, de fazer mil e uma coisas, improvisar, dobrar as vozes dos outros. E é onde nos leva mais longe, porque ou canto eu ou toca ele. Neste caso, o que traz é uma cama harmónica bestial, arranjos fantásticos, outros timbres, outras cores.


Quando se toca com um grupo tão grande como este, não se pode inventar muito e tocar aquilo que bem nos apetece.

Num grupo pequeno, tens uma ideia, segues esse caminho através do improviso, e o grupo, sendo pequeno, ágil e mais maleável, consegue ir atrás. Uma orquestra deste tamanho não pode.

Sente-se musicalmente reprimida por essa dinâmica?

Não, é outra coisa! Continuo a fazer concertos em duo, trio, quarteto, quinteto, assim como com grupos maiores. É muito interessante justamente porque é diferente, nem melhor nem pior.

Falando só da Maria João, o reconhecimento do seu trabalho em Portugal já se pode comparar ao mérito que lhe é atribuído no estrangeiro?

Eu acho que consegui criar um estilo muito pessoal, que é só a Maria João que faz. Não é melhor nem pior que os outros, é Maria João, e acho isto uma coisa mito importante, deve ser a maior busca da nossa parte, a procura pelo nosso ADN. Tanto dentro como fora de Portugal, as pessoas, com o tempo, aprenderam a gostar disso. De início estranharam, ter uma pessoaa fazer coisas das quais não temos nenhuma referência. Eu tenho um público fantástico aqui em Portugal, que me mima imenso, anda comigo ao colo, vai sempre aos meus concertos e enche sempre as salas. E compra os discos, nesta época tão má para isso, continuam a fazer isso. Em Portugal, consideram-me muito exótica (risos). É bom que assim seja! Eu considero-me muito sortuda por ser portuguesa e ter nascido em Portugal. Sempre me disseram que se tivesse nascido noutro lado mais propício ao jazz que a minha vida estaria muito diferente, mas eu acho justamente o contrário. Talvez estaria noutro sítio mas tudo isso me iria parecer um lugar comum, as circunstâncias em que eu apareci tornam tudo diferente. E são essas circunstâncias que me fazem quem sou, ter nascido onde nasci e crescido com quem cresci e da forma que cresci.

A Maria João dá aulas na Escola Superior de Música de Lisboa. Que comparação faz quer entre as nossas escolas de jazz e as estrangeiras, quer entre os alunos portugueses e os estrangeiros?

Não conheço muito as escolas lá de fora mas pelo que tenho ouvido falar, algumas das nossas escolas são muito boas. A escola onde ensino tem professores e condições óptimas, tem uma logística muito boa e músicos fantásticos a dar aulas. Na holanda, onde ficam as escolas de jazz mais reputadas, os professores dessas escolas são grandes fãs do Mário, e alguns também de mim! São fãs, seguem o nosso trabalho, têm discos.. Partindo um pouco deste exemplo, isto diz que há óptimos professores em Portugal, acho que quem faz bem música, consegue sempre passá-la, melhor ou pior, mas consegue. Os alunos são bestiais, há de tudo, mas o nível émuito bom, tenho alunos que atingem um excelente patamar.



E as escolas portuguesas permitem aos seus alunos uma possível carreira internacional?

Permitem. As escolas dão-lhes características que lhes permitem cantar e tocar em qualquer sítio. A dificuldade é que somos um país mais pobre, que está no fundo da Europa, há muitos quilómetros a percorrer para ser músico. Sou amiga do David Linx, com quem já cantei e tenho projectos, ele fala-me dos alunos dele e acho que os nossos alunos até são mais característicos e têm mais personalidade. Lá está, estão na periferia, com circunstâncias muito específicas.

Quais são os artistas portugueses de jazz que a Maria João mais gosta?

O Mário claro, gosto muito do Mário. Também o João Paulo Esteves da Silva, do André Fernandes, é um músico que deu um salto enorme e tem uma personalidade incrível. Gosto da Sara Serpa, da Vânia, a menina que ganhou a Operação Triunfo 3, ela é aluna lá na ESML, tem uma cabeça óptima e é uma cantora soberba, já tem uma solidez no mercado para trabalhar no seu projecto. Depois também há a Mariana Norton, outra brilhante aluna da ESML com o seu projecto a decorrer, o Júlio Resende.. Há muita gente.

Faz-se bom jazz em Portugal.

Então não se faz? Somos um país tão pequeno e temos tanta gente comparativamente ao nosso tamanho, todos com as suas caracteríscticas, com a sua direcção, com o seu ADN, que é realmente notável. Também gosto muito da Maria João (risos). Depois de todas as inseguranças pelas quais uma pessoa passa quando cria algo muito próprio, continuo a achar que estou a fazê-lo bem, umas vezes melhor ou pior mas na altura em que as fiz, foi o melhor possível. E isso deixa-me uma enorme satisfação.

Que concertos podemos esperar para a divulgação deste novo disco?

Para a semana, dia 12, está no Festival de Jazz de Matosinhos, depois o Festival de Jazz de Loulé, seguido do de Marselha. Também vamos à Suiça, ao Funchal. Com o Chocolate, ainda continuo a rodar, depois de Matosinhos tenho dois concertos em Berlim, um em Hamburgo, tenho andado um pouco por todo o lado, o que é muito bom. É óptimo chegar aos sítios, como por exemplo à Turquia, onde estive em Março, e ver aquilo esgotadíssimo, e as pessoas já me conheciam. As coisas estão sempre a andar, não me posso queixar de todo. Dentro de mim, continuo cheia de música e a aventura continua, mais do que nunca.




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