segunda-feira, 18 de abril de 2011

Cuca Roseta - ENTREVISTA

Uma das novas e brilhantes fadistas da nova geração, Cuca Roseta, esteve à conversa com o BANDCOM. Uma fadista diferente, que larga o xaile e os tons negros e agarra a sua própria personalidade. Lança agora um álbum, todas as músicas provam o seu fresco talento.




Foi o fado ao teu encontro ou foste tu que deste com ele?

Fui eu que procurei o fado, por paixão, por precisar dele para me inspirar, mas foi o fado que me procurou para fazer dele a minha vida, eu não achava que tinha nascido para ele. Agora tenho a certeza. Andei a estudar psicologia e direito, e gostava destes, mas não me sentia totalmente preenchida. Hoje, com 29 anos, sinto-me totalmente preenchida no fado. Cantava fado para parar durante o dia.

O fado é muito antigo mas parece que tem cada vez mais fãs, chegando inclusivé a faixas etárias cada vez mais novas. Como é que achas que funciona o processo de alguém, nascido nos dias de hoje, gostar de algo tão tradicional?

Ainda bem que surge essa pergunta. O que o Gustavo (Santaolalla, produtor de Cuca) achou giro em mim, até na escolha da capa, foi não ser uma fadista típica, não ter uma capa de cd nessa onda, foi ser como era e sou. Ele disse “Tu fazes artes marciais, que não tem nada a ver com quem canta, vens do rock, e ouves todo o tipo de música. Não te vestes de preto e não usas xaile. Mas adoras o fado!” Eu sou completamente vidrada no fado, é o único género que me faz sentir em casa.

Eu costumo dizer que o fado me dá imensa pica, mais do que qualquer outra música, é tão difícil uma pessoa cantar fado, passando por todas as fases inerentes – declamar poesia, juntar à voz, juntar às emoções, juntar à experiência de vida, ao mundo. À medida que o tempo passa, vais-te tornando mais fadista, aprendendo a ser mais verdadeiro e a expôr mais as tuas emoções. No fado, estás sempre a ser testado, a ter que improvisar, criar uma melodia própria em cima de algo que te aparece no momento. No Rock isso não acontece, tem muito a ver com a voz e menos com experiências.

Cantas desde que idade?

Desde sempre, cantei em coros, karaokes, acabei por ir para os Toranja, onde também o fazia. Também o fiz num tributo a Rui Veloso. Passei um ano a cantar em bares, nas Docas, nos restaurantes. Passei posteriormente para as tasquinhas de fado na Graça, passando depois para o clube de Fado, em que estou há 6 anos.



E antes de cantares fado, o que é que te fazia pensar nele?

Eu nunca ouvi fado em casa, os meus amigos não ouviam fado. Foi literalmente o fado que me escolheu, como já disse. Eu, não que não gostasse, mas não conhecia Fado, se passava na rádio, mudava a estação. Agora que sou fadista, agora que descobri e estou neste tipo de música, acho quase um atentado as pessoas não o conhecerem. Quando conheci o fado, também não pensei que o fosse cantar. Estava nos Toranja na altura, levaram-me a uma casa de fados e eu achei a música brutal, estava em Lisboa mas sentia-me noutro sítio qualquer.

A passagem para fadista foi muito engraçada, porque parecia que o fado me chamava. Começei a ouvir, participei num concurso de fados e a partir daí é que foi. Quando cantei fado pela primeira vez num ambiente tipicamente fadista pensei “O que é que é isto? Que música inacreditável é esta?” Saí dos Toranja e começei a ir sozinha a casas de fado todas as sextas-feiras. Tive um ano assim, a aprender tudo o que podia, queria sugar aquilo tudo. Começei a entrar nos sítios certos, já que há um caminho gigante a percorrer.

Quais são os fadistas que admiras mais e que mais te influenciaram?

Os únicos que eu oiço em cd porque os adoro são a Ana Moura e o Camané, mexem mesmo comigo, em cd ou ao vivo. E Amália Rodrigues, embora seja difícil ouvir e mais antigo, está lá tudo, é uma voz brutal, uma interpretação inacreditável, todo um talento. Continua a ser a melhor, é o meu exemplo.

O que é que te vão dizendo da tua voz, das tuas músicas, do que tens feito até agora?

A minha mãe nunca gostou de fado. Agora, obriguei-a a ouvir fado, e ela diz-me que o meu cd é espectacular porque o consegue ouvir até ao fim (risos). Mas assim fora da família, e de uma forma mais espontânea, há algo que me deixa surpreendida e feliz, só há uma música com letra e tema da minha autoria. Nem sequer a queria pôr, foi composta ao piano, por ouvido, eu não sei tocar, o Gustavo é que insistiu para que ficasse. E têm me dito que essa é a música de que as pessoas gostam mais, talvez porque lhes soa um pouco mais a comercial, tem a ver com a minha influência. É a minha melodia, as minhas palavras, uma música que me diz muito, e isso deixa-me feliz. De resto, dizem-me que o álbum tem imensa dinâmica, eu também concordo, já que tem pequenas inovações, como fado a vozes, num trio, há um fado traduzido para castelhano, acho que ficou lindo, eu adoro espanhol!

Como é que o fado pode mudar sem se alterar o seu carácter base?

Nunca gostei de misturar o fado com outro tipo de músicas, apesar de ter tentado isso com o “Barco Negro” nos Toranja. Era um exercício gigante, tinha de seguir sempre em fado e eles tinham de andar ali à volta, num top pop. Misturar com outras coisas é brutal, mas não pode ser totalmente fundido.

E a inovação tem de partir um pouco da voz, porque as guitarras não podem de todo mudar.

Exactamente, é pela maneira de cantar e falar . Antigamente, as pessoas tinham uma forma de cantar e falar mais clássica, que não nos soa tão bem hoje em dia. O fado antigo era obviamente mais clássico, mas quando é chega pela voz de jovens, soa melhor ao público jovem. Aí já muda tudo. A linguagem, do amor cantado pelo fado, é transversal a idades, pelo que todos a devem poder ouvir.

Após a morte da Amália houve um “buraco” no aparecimento de novos fadistas, pelo que, desde a Mariza, surgiu uma nova vaga de imenso talento. Será que estes dois factos estão relacionados?

Agora não há só um talento, existem vários, mas eu acho que não foi pela morte dela, antes pelo que ela deixou, ela modernizou o fado, tirou-o dos bairros, fez o fado canção. Ela simplesmente foi ela própria. Quando ela transforma o fado, chega-nos a nós, fadistas, o fado dos grandes poetas cantados. Todos os fados da Amália são algo muito mais acessível para nós do que eram aquelas histórias dos descobrimentos, do bairro, da saudade.

O que podemos esperar da tua carreira nos próximos tempos?

O Gustavo Santaolalla está a preparar para mim uma carreira completamente internacional. Vou ser distribuída em muitos países, ele já tem as agências prontas, aqui na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos para que, assim que enveredar por essa opção, estar tudo pronto. A Universal quer que eu começe só por Portugal, por ser o meu país. Depois do lançamento, vou começar a fazer concertos de norte a sul e a seguir, vou começar a estar mais lá fora.





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