Dizer que temos ao nosso alcance um starsystem à nossa medida é algo cruel e elíptico. Estamos finalmente a tentar navegar naquelas piscinas super-modernas que ondulam a comando próprio e ainda por cima carregamos os valores daquilo que julgamos, e na verdade é mesmo, boa música para este ou aquele público. Mas depois temos super-talentos tão perto das nossas vidas que não sabemos bem como lidar com isso à saída da mercearia mais próxima da mesma forma que desconhecemos a próxima maré que pensamos que estamos a controlar.
Só que com Marta Ren é diferente. Nós já sabemos o que vem dali há muito, muito tempo. Mas agora a atenção cresce, o foco muda para a soul que carrega com uma banda incrível ora reinterpretando clássicos perdidos como "I'm Not Your Regular Woman" ou "Well I Done Got Over It" e surpreendendo-nos em temas como "2 Kinds Of Men" quando se torna inatingível e paira por muito mais terrenos do que o da classic soul music. Com a personalidade que a manteve relevante ao longo de todos estes anos ela não é apenas a nossa Sharon Jones, a nossa Amy Winehouse.
Diz ela que é teimosa e que mais da sua personalidade fica numa entrevista com os pais. Se calhar, temos de tratar disso. Havemos de lá chegar.
Mas ela já "lá" chegou. Com a pele de galinha por conta da casa e o reconhecimento por conta dos turistas internacionais que se vêem no olho do furacão despertado pela Record Kicks especialmente desde Fevereiro, data de lançamento de "Stop, Look, Listen", só deu para estas perguntas.
BandCom (BC): Se há algum tempo atrás imaginasses como seria a melhor fase da tua carreira, dirias que estás mais perto de lá chegar?
Marta Ren (MR): Sempre que começo uma banda ou um projecto, e finalmente esta aventura a solo, entrego-me totalmente e acho sempre que esse trabalho vai dar origem à melhor fase da minha carreira. Sinto que estou no caminho certo para o que sempre quis mas também tenho aquela sensação que "o melhor ainda está para vir", embora me sinta bastante realizada com tudo que está a acontecer com o " Stop, Look, Listen" desde Fevereiro.
BC: Dirias que Marta Ren & The Groovelvets é uma consequência do teu percurso musical até aqui ou antes gostarias de ter começado por aqui?
MR: É uma consequência sem dúvida, não teria feito este disco com esta maturidade sem ter a escola dos Sloppy Joe ou a paixão pelos Bombazines, tudo foi relevante, contou e foi importantíssimo para chegar até à aventura a solo.
BC: As tuas raízes familiares e geográficas, bem como aquelas dos que te acompanham ou acompanharam, desempenham um papel objectivo na persistência de uma carreira artística como a que tens e queres ter?
MR: O meu pai foi músico amador, o meu avô adorava cantar (e cantava bem), a minha mãe sempre adorou música, sempre houve música em casa dos pais e dos avós. Geograficamente, sou da Sra. da Hora mas estudei desde cedo no Porto. Todos sabemos que temos um lado raçudo e persistente, pode ter sido este conjunto de coisas que me tenha levado a ser tão resiliente ou mesmo e só a minha personalidade. Quem me conhece e está de fora saberá respondê-lo melhor, tens de entrevistar os meus pais (risos).
BC: Quando aprecias o reconhecimento que estás a ter em países que não Portugal, achas que o mesmo depende do estilo que entretanto adoptaste para a tua carreira a solo? Estás a receber na mesma medida daquilo que queres dar enquanto "performer"?
MR: Para ser honesta, estou a receber mais do que expectei. Ter a Wax Poetics, a Blues & Soul Magazine, o Dan Aykroyd aka Elwood Blues a fazerem críticas maravilhosas e a reconhecerem o meu trabalho de igual para igual com algumas das minhas referências foi mais do que eu esperava. Não te vou mentir e dizer que nunca sonhei com isto, mas tento sempre conter as minhas expectativas para não me desiludir.
BC: Dentro do universo 'soul', e também uma vez que partes de referências clássicas deste tipo de sonoridade, o que é que vês como mais importante para criar a tua própria notoriedade, algo que sobretudo numa carreira internacional torna-se tão difícil quando importante? É mais difícil agora o tal 'stop, look, listen' que antecede um novo passo a dar em relação a outras alturas onde as coisas poderiam acontecer de forma ainda mais espontânea e crua?
MR: Estamos na era da Internet, nada é tão difícil como há 20 anos atrás independentemente do estilo de música que faças. O segredo para ultrapassar a dificuldade é trabalhar, trabalhar todos os dias para se chegar onde se quer, até se chegar lá e voltar a fazer o mesmo do início as vezes que forem precisas.
BC: A produção e a qualidade dos instrumentais em disco têm sido decisivos para elevar a voz da Marta Ren a outros patamares de relevância. Qual é o "feedback" mais importante que podem ter, ou que já tiveram, em relação aos vossos espectáculos?
MR: Todo o conteúdo deste disco é importantíssimo, desde os microfones que fizeram a captação dos instrumentos aos compressores, tudo material analógico e vintage. As músicas, as letras, os arranjos das músicas, a edição, a mistura, a masterização do disco...foi tudo feito de forma muito perfeccionista e cuidada, embora a sonoridade final se reflicta num som mais sujo e envolvente que pode parecer um contra-senso.
O melhor feedback que tivemos até agora foi 5 franceses que fizeram 300km para nos verem e poderem ter os discos assinados no final e sabiam as letras de cor do inicio ao fim.
BC: Valendo o que valem os "videoclips" para a carreira musical de alguém, é notória uma nova direcção na história e na elaboração dos vídeos que têm servido de suporte aos “singles”. Concordas?
MR: Eu acho que os videoclipes sempre foram importantíssimos. Há músicas de que nem gostas muito mas os vídeos são tão fixes que acabas por vê-los mais que uma vez. Acho muito importante um vídeo aliado a um single.
BC: Nesta altura estás a ter oportunidades que esperaste 20 anos para ter. Por um lado, grandes palcos/festivais/eventos, a projecção mediática, e por outro a projecção de uma carreira com ambições totalmente internacionais. Agora que estás a tentar atingir novos objectivos, os obstáculos que havia antes para que, quem sabe, já os tivesses atingido mantêm-se?
MR: Sim, os obstáculos são praticamente os mesmos. Estes 20 anos trouxeram-me outra paciência e sapiência para os ultrapassar. A luta não é muito diferente das anteriores. Levares uma banda de 9 elementos para a estrada nunca foi fácil nem dentro nem fora de portas, o que vale é que sou teimosa (risos).
BC: Décadas volvidas, e apesar de a “soul “ basear-se e crescer a partir da independência de género, o que é o “poder soul” visto pela óptica de uma mulher que tanto pode pegar numa história sua ou noutra que lhe sirva de inspiração para chegar ao estado de espírito que pretende passar?
MR: A soul é a alma, fala da vida, da vida vivida, do que sentes das tuas entranhas e do que sofres e aprendes com isso e a classic soul music reproduz isso tudo, traz o que muita gente passa e sente mas não o consegue expressar.
BC: Já subiste ao palco das Noites Ritual embora não em nome próprio como agora. Tens recordações destes 24 anos de concertos no Porto no final do Verão?
MR: Tenho as melhores recordações, fui a muitas edições - em 2000 com os Sloppy Joe mas antes e depois como espectadora-, são noites de reencontros, de histórias de final de Verão, de se poder descobrir boas bandas que andam com menos atenção por parte dos media. Noites Ritual = a Noites de Celebração.
BC: Qual é o “talento clandestino” que mais aprecias num outro músico ou intérprete?
MR: Que cante ou toque ou componha com verdade, com o que está a sentir no momento e não à procura de algum tipo de fórmula que deu resultado no passado ou que acha que pode repetir.
Só que com Marta Ren é diferente. Nós já sabemos o que vem dali há muito, muito tempo. Mas agora a atenção cresce, o foco muda para a soul que carrega com uma banda incrível ora reinterpretando clássicos perdidos como "I'm Not Your Regular Woman" ou "Well I Done Got Over It" e surpreendendo-nos em temas como "2 Kinds Of Men" quando se torna inatingível e paira por muito mais terrenos do que o da classic soul music. Com a personalidade que a manteve relevante ao longo de todos estes anos ela não é apenas a nossa Sharon Jones, a nossa Amy Winehouse.
Diz ela que é teimosa e que mais da sua personalidade fica numa entrevista com os pais. Se calhar, temos de tratar disso. Havemos de lá chegar.
Mas ela já "lá" chegou. Com a pele de galinha por conta da casa e o reconhecimento por conta dos turistas internacionais que se vêem no olho do furacão despertado pela Record Kicks especialmente desde Fevereiro, data de lançamento de "Stop, Look, Listen", só deu para estas perguntas.
BandCom (BC): Se há algum tempo atrás imaginasses como seria a melhor fase da tua carreira, dirias que estás mais perto de lá chegar?
Marta Ren (MR): Sempre que começo uma banda ou um projecto, e finalmente esta aventura a solo, entrego-me totalmente e acho sempre que esse trabalho vai dar origem à melhor fase da minha carreira. Sinto que estou no caminho certo para o que sempre quis mas também tenho aquela sensação que "o melhor ainda está para vir", embora me sinta bastante realizada com tudo que está a acontecer com o " Stop, Look, Listen" desde Fevereiro.
BC: Dirias que Marta Ren & The Groovelvets é uma consequência do teu percurso musical até aqui ou antes gostarias de ter começado por aqui?
MR: É uma consequência sem dúvida, não teria feito este disco com esta maturidade sem ter a escola dos Sloppy Joe ou a paixão pelos Bombazines, tudo foi relevante, contou e foi importantíssimo para chegar até à aventura a solo.
BC: As tuas raízes familiares e geográficas, bem como aquelas dos que te acompanham ou acompanharam, desempenham um papel objectivo na persistência de uma carreira artística como a que tens e queres ter?
MR: O meu pai foi músico amador, o meu avô adorava cantar (e cantava bem), a minha mãe sempre adorou música, sempre houve música em casa dos pais e dos avós. Geograficamente, sou da Sra. da Hora mas estudei desde cedo no Porto. Todos sabemos que temos um lado raçudo e persistente, pode ter sido este conjunto de coisas que me tenha levado a ser tão resiliente ou mesmo e só a minha personalidade. Quem me conhece e está de fora saberá respondê-lo melhor, tens de entrevistar os meus pais (risos).
BC: Quando aprecias o reconhecimento que estás a ter em países que não Portugal, achas que o mesmo depende do estilo que entretanto adoptaste para a tua carreira a solo? Estás a receber na mesma medida daquilo que queres dar enquanto "performer"?
MR: Para ser honesta, estou a receber mais do que expectei. Ter a Wax Poetics, a Blues & Soul Magazine, o Dan Aykroyd aka Elwood Blues a fazerem críticas maravilhosas e a reconhecerem o meu trabalho de igual para igual com algumas das minhas referências foi mais do que eu esperava. Não te vou mentir e dizer que nunca sonhei com isto, mas tento sempre conter as minhas expectativas para não me desiludir.
BC: Dentro do universo 'soul', e também uma vez que partes de referências clássicas deste tipo de sonoridade, o que é que vês como mais importante para criar a tua própria notoriedade, algo que sobretudo numa carreira internacional torna-se tão difícil quando importante? É mais difícil agora o tal 'stop, look, listen' que antecede um novo passo a dar em relação a outras alturas onde as coisas poderiam acontecer de forma ainda mais espontânea e crua?
MR: Estamos na era da Internet, nada é tão difícil como há 20 anos atrás independentemente do estilo de música que faças. O segredo para ultrapassar a dificuldade é trabalhar, trabalhar todos os dias para se chegar onde se quer, até se chegar lá e voltar a fazer o mesmo do início as vezes que forem precisas.
BC: A produção e a qualidade dos instrumentais em disco têm sido decisivos para elevar a voz da Marta Ren a outros patamares de relevância. Qual é o "feedback" mais importante que podem ter, ou que já tiveram, em relação aos vossos espectáculos?
MR: Todo o conteúdo deste disco é importantíssimo, desde os microfones que fizeram a captação dos instrumentos aos compressores, tudo material analógico e vintage. As músicas, as letras, os arranjos das músicas, a edição, a mistura, a masterização do disco...foi tudo feito de forma muito perfeccionista e cuidada, embora a sonoridade final se reflicta num som mais sujo e envolvente que pode parecer um contra-senso.
O melhor feedback que tivemos até agora foi 5 franceses que fizeram 300km para nos verem e poderem ter os discos assinados no final e sabiam as letras de cor do inicio ao fim.
BC: Valendo o que valem os "videoclips" para a carreira musical de alguém, é notória uma nova direcção na história e na elaboração dos vídeos que têm servido de suporte aos “singles”. Concordas?
MR: Eu acho que os videoclipes sempre foram importantíssimos. Há músicas de que nem gostas muito mas os vídeos são tão fixes que acabas por vê-los mais que uma vez. Acho muito importante um vídeo aliado a um single.
BC: Nesta altura estás a ter oportunidades que esperaste 20 anos para ter. Por um lado, grandes palcos/festivais/eventos, a projecção mediática, e por outro a projecção de uma carreira com ambições totalmente internacionais. Agora que estás a tentar atingir novos objectivos, os obstáculos que havia antes para que, quem sabe, já os tivesses atingido mantêm-se?
MR: Sim, os obstáculos são praticamente os mesmos. Estes 20 anos trouxeram-me outra paciência e sapiência para os ultrapassar. A luta não é muito diferente das anteriores. Levares uma banda de 9 elementos para a estrada nunca foi fácil nem dentro nem fora de portas, o que vale é que sou teimosa (risos).
BC: Décadas volvidas, e apesar de a “soul “ basear-se e crescer a partir da independência de género, o que é o “poder soul” visto pela óptica de uma mulher que tanto pode pegar numa história sua ou noutra que lhe sirva de inspiração para chegar ao estado de espírito que pretende passar?
MR: A soul é a alma, fala da vida, da vida vivida, do que sentes das tuas entranhas e do que sofres e aprendes com isso e a classic soul music reproduz isso tudo, traz o que muita gente passa e sente mas não o consegue expressar.
BC: Já subiste ao palco das Noites Ritual embora não em nome próprio como agora. Tens recordações destes 24 anos de concertos no Porto no final do Verão?
MR: Tenho as melhores recordações, fui a muitas edições - em 2000 com os Sloppy Joe mas antes e depois como espectadora-, são noites de reencontros, de histórias de final de Verão, de se poder descobrir boas bandas que andam com menos atenção por parte dos media. Noites Ritual = a Noites de Celebração.
BC: Qual é o “talento clandestino” que mais aprecias num outro músico ou intérprete?
MR: Que cante ou toque ou componha com verdade, com o que está a sentir no momento e não à procura de algum tipo de fórmula que deu resultado no passado ou que acha que pode repetir.
André Gomes de Abreu