domingo, 9 de dezembro de 2012

TEMPORADA MOURAH: ENTREVISTA




Quase 10 anos após a estreia com “From One Human Being To Another, Mourah está de regresso com “Breakup 28”, o single de avanço para um novo disco, “Kardia”, a editar durante 2013. Por cá, este período irá ser especial: faremos uma retrospectiva da ainda curta carreira do músico e acompanharemos passo a passo todas as fases deste aguardado regresso. Hoje, na antevisão do lançamento do novo single, estivemos animadamente à conversa com Mourah para vos mostrar em primeira mão quem é o músico de “J. Butterfly” em 2012. 



BandCom (BC): Quase 10 anos volvidos após a edição de “From One Human Being to Another”, quem é este Mourah que agora voltaremos a conhecer?

Mourah: Pela força das coisas, um artista e homem mais maduro, mais seguro e menos preocupado com o que as pessoas possam pensar acerca do meu trabalho ou da minha forma de ser. Na altura do primeiro álbum, estava em período de luto e as gravações tornaram-se uma forma de terapia, uma forma de evacuar a dor. Hoje em dia, a dor deu lugar a uma vontade exacerbada de desfrutar da vida. Sinto muita fome de prosseguir a minha carreira e dar a conhecer o meu novo trabalho. Para sempre serei “ frágil nas pequenas coisas, mas forte nas grandes”, como disse tão bem a Amália Rodrigues.

BC: No primeiro single do novo disco, “Breakup 28”, vemos um lado diferente do Mourah que conhecemos com o primeiro disco, uma faceta (ainda) mais acessível e mais pop. Podemos esperar algo assim extensível ao novo disco, isto é, o Mourah reavaliou a sua linguagem musical anterior ou tudo isto é apenas a materialização da diversidade de coordenadas que pretendes imprimir no teu trabalho?

Mourah: Durante anos, censurei a palavra pop. Deixei-me levar pela ideia de que a pop é necessariamente fácil, comercial e musicalmente grosseira. Alguns meios alternativos têm tendência a serem eles próprios muito conservadores e sectários e podem por vezes rejeitar um estilo ou outro em bloco. Hoje em dia, as barreiras dos géneros já não são tão lineares e rígidas. Quando ouço a Lykke Li, Florence + The Machine, The Dø, Little Dragon, entre outros, ouço bastante qualidade e sinceridade, pertinência no discurso musical. No entanto, não deixa de ser pop, pop-electro, pop-alternativa, pop-experimental. Mas pop na sua essência. Libertei-me dos preconceitos, e decidi também dar eco ao meu lado mais pop.
O meu discurso musical vai no mesmo sentido que artistas como o Prince, Beck, Jay-Jay Johansson, David Bowie, ou seja artistas multi-facetas, que não se deixam fechar num estilo particular. Penso que reflecte igualmente o amante de música que sou: posso ouvir o Jimmy Scott, arrepiar-me todo, para minutos seguintes deixar-me guiar por Arvö Part, e finalmente pular ao som dum velho Asian Dub Foundation.

BC: Porquê “Kardia”? Como tem decorrido a produção das novas canções? Consegues encaixá-las num conceito que as reúna e diferencie de canções que optaste por não colocar neste novo disco?

Mourah: Queria um nome curto, federativo e universal. Gosto da saber da etimologia das palavras e aos poucos “Kardia”, coração em grego, tornou-se uma evidência. É um órgão que rege o nosso corpo mas que metaforicamente representa as nossas emoções. Gosto dessa dualidade...A música em si tem essa magia de agir ao mesmo tempo a nível físico e emocional no ouvinte.
A nível de produção, os temas foram-se acumulando nestes anos, deixei-os crescer em mim. Aos poucos vou encontrando um pulsar comum, uma sensação idêntica em todos eles, mesmo que abranjam estilo diferentes entre eles. A ideia é conseguir passar de um tema electro a outro com raízes trip-hop para seguir numa balada soul, mas sempre com o meu toque pessoal e tom estilístico, e não tanto eliminar à partida este ou outro tema. Geralmente ouço umas 20 vezes as maquetas. Se ainda acho o tema interesante após tantas escutas, então considero que vale a pena ir em frente com ele. O álbum vai ser co-produzido pelo Yvan Bing, que é o melhor engenheiro de som suíço, o que me vai ajudar a uniformizar o todo, através do seu olhar exterior.

BC: Quais as tuas principais influências, musicais ou não, para a construção deste disco em especial?

Mourah: Acho sempre difícil responder a isso. Influências acontecem todos os dias, com pessoas que frequentamos, musica que ouvimos, etc. Mas diria que ultimamente tenho visto muitos filmes, da era Nouvelle Vague e não só, o que vai dar uns ambientes por vezes cinematográficos e visuais aos meus temas. Outro aspecto que me influencia será a minha relação com o meu próprio corpo: qual a sua musicalidade? Como reage ele ao esforço? Isso devo-o muito à prática de Yoga, que abracei há uns anos atras. O primeiro álbum era dirigido por e para os outros seres humanos, este talvez será mais íntimo e dirigido a mim próprio em primeiro lugar. Como que a questionar-me: quem és tu, enquanto músico, enquanto pessoa?



BC: Portugal ou Suíça qual o país que mais te influencia e em que melhor consegues integrar a música que fazes?


Mourah: O meu coração nunca deixa de ser português e a minha mente suíça. Mas hoje em dia, sinto-me simplesmente cidadão do mundo. Estamos perto de tudo, constantemente ligados uns aos outros. A nossa música pode ser ouvida pelos quatro cantos deste planeta. Acho que a minha música é internacional. No entanto, não importa o que faço, transparece sempre uma parte de sofrimento e tristeza nos meus temas. Ou seja, a “saudade”. 


BC: Como imaginas um novo “New Versions EP”, isto é, na altura tiveste canções remisturadas pelo Miguel Cardona (Coldfinger) e pelo João Pedro Coimbra (Mesa), por exemplo. Neste momento, consegues identificar algum outro projecto em Portugal com o qual gostarias de te relacionar de alguma maneira (exceptuando os projectos do Armando Teixeira, claro, por razões de extrema afinidade entre vós)?


Mourah: Confesso estar algo desactualizado em relação ao panorama musical português, mas prometo fazer trabalho de casa em breve. Gosto das interacções e do partilhar entre músicos e produtores. Hoje em dia, as produções musicais não têm nada a invejar ao que se faz lá fora. O profissionalismo está agora presente em todos os processos da produção musical. Ouvi recentemente um tema da Miúda, num estilo mais pop. Gostei bastante. Em Março será editado um EP com remisturas dos Wiseguys from Lisbon, Armando Teixeira e um grupo suíço, Sumo, do single “Breakup 28”.


BC: Durante este hiato, a “J. Butterfly” fez de banda-sonora de um anúncio de televisão para um perfume grego visto também noutros países, cantaste e colaboraste noutros projectos tão diferentes como um quarteto de tango ou uma companhia de teatro. Que aspectos retiras dessas experiências para o teu trabalho?


Mourah: Que a vida leva-nos por vezes a sítios que nunca esperávamos vir a conhecer. Que por vezes não vale a pena fazer planos, mas sim usufruir do que a vida nos oferece. Lembro-me dum concerto em Varsóvia, onde ninguém me conhecia, mas quando ouviram o tema J.Butterfly, o público entoou o tema todo. Fiquei tão surpreendido...

Nunca cheguei a saber se esse perfume cheira bem. Penso que o álbum “Kardia” vai refletir esse estado de espírito, saber tomar riscos, deixar fluir as energias, não me impondo limites na minha criatividade e não pensar no resultado ou os benefícios que possa tirar dele.

BC: Para ti, porque Portugal deixou, até agora,” escapar” a música de Mourah? É este o Portugal musical que esperavas conhecer em 2012 quando estavas em 2003?


Mourah: Se bem que Portugal por vezes não dá valor ao que é made in Portugal, não me deixou “escapar”, eu é que voltei à Suiça. Na altura, a minha antiga editora, dirigida por uma pessoa sem escrúpulos e respeito pelos artistas, foi à falência. Senti-me algo desiludido com o meio da música e decidi prosseguir os meus estudos na universidade de Genebra. Também sentia saudades da minha família e amigos de longa data.

Com a morte anunciada das majors e o advento das labels independentes, sente-se uma democratização da música a nível mundial, inclusive em Portugal. Gostava de ter conhecido esse meio em 2003-2005. Mas na altura pude conhecer pessoalmente os The Gift, os Blasted Mechanism, Coldfinger, Armando Teixeira, cruzei-me com o Pedro Abrunhosa...não tenho razões de queixa.

BC: No videoclip do teu novo single aparece a Tina Marlow, uma jovem e promissora actriz suíça. A sua participação vai de encontro às tuas expectativas para o videoclip?

Mourah: Digam vocês!.. Pelas reacções das pessoas, ela traz de facto muito luz e sensualidade ao videoclip. Foi generosa no trabalho, simples e divertida a nível humano. A título pessoal, beija muito bem! Em 2013, vai aparecer num filme com Pierce Brosnan, “Love Punch”: não me importava de ter o charme dele.

BC: “Um bom tema dá uma boa remistura”: é uma regra sem excepção?

Mourah: Uma remistura é sempre um casamento entre dois mundos, por vezes bem distintos, entre autor do tema e o produtor que lhe dá outra vida. Quando as duas partes partem com intenções sinceras, sim, acho que a regra confirma-se. No entanto, na minha opinião, quando se trata de uma obra de arte e não de um “bom tema”, não se toca. Há temas tão perfeitos que fazer deles uma remistura não iria trazer mais valor. 



BC: Está na tua mente um regresso a Portugal para a apresentação deste novo disco?

Mourah: Se Portugal o quiser de mim, com certeza. Em conjunto com o meu agente, estamos a trabalhar nesse sentido. Num primeiro tempo para entrevistas e showcases e se houver receptividade, uns concertos. É o meu desejo, voltar a sentir o carinho e energia do público português. Temos muito tempo a recuperar.


André Gomes de Abreu

Tags: Entrevistas ; Mourah




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